Jardim de Alah e Lagoa Rodrigo de Freitas. (Fotos: Prefeitura do RJ / Reprodução)COLUNISTAS, GERAL, POLÍTICAA praça é nossa – por Siro Darlan MAZOLA, 9 horas ago 0 5 min read 21374
Por Siro Darlan –
Jardim de Alah e Lagoa agonizam.
A democracia nasceu na praça pública, onde os cidadãos gregos discutiam o governo (cracia) do povo (demo). Era na Ágora que os cidadãos discutiam e decidiam sobre temas ligados a justiça, obras públicas, leis, cultura, etc. Os cidadãos votavam e decidiam através do voto direto. Também é um local para debates dos cidadãos. Quando você ocupa a praça com a burguesia, você tira o espaço do povo, logo você acaba com a democracia.
A Prefeitura do Rio ignorando a Lei Orgânica do Município, sob o silêncio conivente dos vereadores, representantes do povo, eleitos para defender seus interesses públicos alienando uma praça pública construída e concebida, ao ser inaugurado em 1938 com objetivos ecológicos para ligar as praias do Leblon e Ipanema à Lagoa Rodrigo de Freitas e sociais, para reunir o povo não apenas para o lazer e contemplação das belezas naturais, mas para atrair turistas, embelezado com esculturas, lagos e caramanchões ao longo dos jardins.
Todas as urbes procuram atrair a população para reuniões em espaços públicos. Por isso o sábio legislador inseriu na Lei Orgânica do Município o artigo 235 que ao definir as áreas verdes, praças, parques, jardins e unidades de conservação como patrimônio público inalienável, e por tal definição é proibida sua concessão ou cessão, bem como qualquer atividade ou empreendimento público ou privado que danifique ou altere suas características originais.
Mesmo com essa clareza, que não comporta qualquer outra interpretação, a Prefeitura do Rio de Janeiro insiste em fazer ouvidos moucos aos reclamos da população, e com apoio midiático e interesse econômico acima do interesse público, transfere para a inciativa privada área pública inalienável, sob o silencio dos fiscais da lei, das autoridades responsáveis pela defesa do meio ambiente uma área de 93,6 mil metros quadrados em local nobre da cidade.
Convoco Mário Quintana, nos contava:
“O que mata um jardim não é mesmo alguma ausência
“nem o abandono…
“O que mata um jardim é esse olhar vazio
“de quem por eles passa indiferente.”
Os moradores, que não foram ouvidos serão prejudicados porque os prédios antigos não dispõe de garagens, portanto recorrem aos estacionamentos públicos pagando R$2 reais por período, e serão onerados com estacionamento privado que cobrará até R25 reais por hora. A ocupação da área verde por um shopping aberto com predominância para espaço comercial que não pode ocupar a área destinada a uso do povo. As notícias (dado o caráter sigiloso que a Prefeitura tem tocado o projeto de alienação do espaço público, sem respeito ao princípio da publicidade) apontam que o poder público municipal está concedendo a inciativa privada 93,6 mil metros quadrados, que inclui três praças Almirante Saldanha, Grécia e Paul Claudel.
O projeto inicial do urbanista francês Alfred Agache foi para o espaço, e mais uma vez desrespeitando o texto legal, o empreendimento dado aos mercadores danifica e altera suas características originais. Se hoje o Jardim de Alah está no estado que se encontra, a culpa é exclusiva do poder público que permitiu que a Companhia do metrô utilizasse a área como canteiro de obras e não cumpriu sua obrigação contratual de restaurar a praça para o povo. Além disso, mostrando todo seu desprezo pela população ocupou parte dos Jardins com um canteiro de lixo, pertencente à Comlurb, empresa pública municipal.
Os ecologistas, sobretudo as Secretarias de Meio ambiente permitiram que durante as obras do metrô quase cem árvores fossem derrubadas e até hoje não replantadas no local. Há ainda que se questionar que a Praça Paris, espaço de lazer na Gloria, antes abandonado pelo poder público e com dimensões semelhantes ao jardim de Ala foi restaurada e devolvida ao povo por apenas R$ 4 milhões de reais. Ora o que explica essa soma anunciada de investimento de R$18 milhões no Jardim de Alah? O povo precisa ser informado e falta de transparência nesse processo de alienação do espaço público necessita ser melhor explicado pelos agentes públicos.
Os moradores acionaram o judiciário, que vendo tais irregularidade concedeu liminar impedindo a adjudicação do espaço público. Espera-se que o Ministério Público aja em defesa da sociedade e que as autoridades responsáveis pelo meio ambiente evite essa atrocidade. A Lagoa agoniza, mas não pode morrer pela sua importância para nossa Cidade Maravilhosa.
Recorro-me a Cecília Meireles, que se estivesse viva somaria com os moradores do Jardim de Alah para declamar o seu poema “Leilão de Jardim”:
“Quem me compra um jardim com flores?
“Borboletas de muitas cores,
“lavadeiras e passarinhos,
“ovos verdes e azuis nos ninhos?
“Quem me compra este caracol?
“Quem me compra um raio de sol?
“Um lagarto entre o muro e a hera,
“uma estátua da Primavera?
“Quem me compra este formigueiro?
“E este sapo, que é jardineiro?
“E a cigarra e a sua canção?
“E o grilinho dentro do chão?
(Este é o meu leilão.)”
SIRO DARLAN – Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Especialista em Direito Penal Contemporâneo e Sistema Penitenciário pela ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados; Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo; Membro da Comissão da Verdade sobre a Escravidão da OAB-RJ; Membro da Comissão de Criminologia do IAB. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.