ADOÇÕES XI – Os Grupos de Apoio à Adoção – por Siro Darlan e Silvana do Monte

Imagens ilustrativas. (Arquivo Google)COLUNISTASESPECIALADOÇÕES XI – Os Grupos de Apoio à Adoção – por Siro Darlan e Silvana do Monte  MAZOLA18 horas ago 0  7 min read  23993

Por Siro Darlan e Silvana do Monte Moreira –

Série Especial: ADOÇÕES – Parte XI.

O abandono de crianças e adolescentes, as questões envolvendo maus-tratos, negligência e outras ensejadoras das situações de vulnerabilidade e risco social, os longos períodos de institucionalização a que ficam submetidas essas crianças e adolescentes, e os desafios do processos de destituição de poder familiar e o de adoção são questões sociais e jurídicas que atravessam gerações.

Os Grupos de Apoio e Adoção remontam à década de 1990, tendo iniciado suas ações, timidamente, através da atuação de pais e mães por adoção em reuniões realizadas no próprio quintal, na perspectiva de refletirem sobre as peculiaridades da parentalidade adotiva, a construção e fortalecimento dos vínculos entre pais e filhos adotivos, a superação dos mitos e preconceitos enraizados na sociedade e a busca de soluções para aquelas crianças alijadas do direito à convivência familiar.

Em 1996, no I Encontro Nacional de Associações e Grupos de Apoio à Adoção, surgiu a ideia de pleitear a instituição do Dia Nacional da Adoção que, através da Lei 10447/2002, passou a ser a data de 25 de maio. Essa, sem dúvida, foi uma grande vitória dos Grupos de Apoio à Adoção, pois despertou a atenção para o tema da adoção, colocando-o na pauta política.

Os GAAs, como são chamados, atuam nas esferas social e política, com vistas à defesa e garantia do direito à convivência familiar, e à promoção da cultura da adoção legal, segura e para sempre.

O trabalho da grande maioria dos GAAs tem caráter voluntário, tendo na sua génese a participação de pais e mães por adoção, e a adesão de profissionais da área da Infância, como advogados, psicólogos, assistentes sociais, pedagogos, antropólogos, que reconheceram na missão e objetivos dos GAAa uma proposta concreta e efetiva em prol do direito de toda criança e adolescente viver em família.

Assim, hoje os GAAS contam, também com uma rede de apoio que só cresce e impacta diversos setores da sociedade, como universidades, escolas, igrejas, entre outros, bem como os poderes instituídos, ensejando iniciativas legislativas, outras no âmbito do Executivo e Judiciário, que têm disseminado a cultura da adoção.

Muitos GAAS têm personalidade jurídica, outros informais são albergados por associações estaduais. A falta de constituição não tira a legitimidade de atuação dos GAAS os quais mantém, inclusive, parceria técnica com as Varas da Infância e da Juventude na realização do curso preparatório para habilitação à adoção e, também, no apoio ao pós-natal da adoção.

As reflexões se debruçam sobre a motivação para a adoção e a disponibilidade do amor, a possibilidade de estabelecer laços afetivos além dos laços biológicos, as adoções necessárias (crianças negras, indígenas, maiores, grupos de irmãos e com deficiência), a definição do perfil, o estágio de convivência, e demais pontos relativos ao exercício da parentalidade responsável.

Não há dúvida que o trabalho realizado pelos GAAS tem sido verdadeiro suporte na orientação adequada dos pretendentes à adoção para opção pela via legal, um incentivo responsável à alteração do perfil inicial da criança ensejando um maior número de adoções necessárias, a promoção da visibilidade das crianças institucionalizadas e “varridas para debaixo do tapete da sociedade”, o reconhecimento da busca ativa como ferramenta fundamental na promoção da convivência familiar e o apoio fundamental às famílias para o êxito e perenidade das adoções.

Passemos agora aos relatos das adoções:

Thaís Rittieri

Quando criança, nunca gostei do fato de precisar explicar o vínculo, não reconhecido, com meu pai. Meu pai se chama Lucas, mas em todos os meus documentos e perante a sociedade o nome que eu precisava informar era o do meu genitor e, na maioria das vezes, eu precisa explicar como as coisas funcionavam.

Essa insatisfação dos “documentos” nos motivou a buscar o nosso reconhecimento e isso aconteceu no ano de 2019. Mas nossa história começou muito antes de 2019. Em 1994 ganhei um padrasto. O que eu não sabia é que esse padrasto me escolheria para ser sua filha e eu o escolheria para ser meu pai.

Quando eu completei 7 anos resolvi formalizar o primeiro reconhecimento dessa paternidade (talvez mais importante do que o processo da paternidade socioafetiva): escrevi, com os garranchos que me acompanham até hoje, uma cartinha para ele com a pergunta direta, para não dar tempo de pensar: “Posso te chamar de pai?” e ainda coloquei dois quadradinhos indicando o “sim” e o “não”.

Para minha nada surpresa ele marcou o sim.

O primeiro reconhecimento, o poder chamar publicamente de pai, o colocar o devido nome na relação, era muito importante para mim.

Afinal, eu não entendia porque chamava a pessoa que cuidava de mim como se eu fosse sua filha por seu nome próprio. Na época eu chamava o meu genitor por seu nome próprio e isso sim fazia sentido. A família estranhou, questionou, muitos não entendiam o motivo para se chegar tão longe, alguns encararam como falta de responsabilidade por parte de meu pai (estavam com medo de que caso ele e minha mãe se separassem, eu ficasse sem nenhum pai).

Hoje, refletindo sobre o avanço das relações socioafetivas, é possível compreender o receio. Apesar de ter combinado de que ele me chamaria de filha e eu o chamaria de pai, ainda faltava alguma coisa. Faltava o reconhecimento do Estado; a mudança na certidão; a legitimidade.

Os anos passaram, me formei em Direito com ênfase em relações familiares e fui atrás do nosso reconhecimento.

Dessa vez, sem precisar explicar nada para ninguém, fomos a um cartório extrajudicial dar entrada em nosso pedido: Reconhecimento de Paternidade Socioafetiva. Apesar de estarmos mais do que preparados para contar nossa vida para uma pessoa estranha que iria nos avaliar, o cenário foi composto por vozes trêmulas e olhos marejados.

Felizmente, após nossa oitiva, a oficial não tinha dúvidas sobre nossa relação. O processo seguiu para o juiz da Vara de Registro Público, foi ao MP e voltou para sentença. Felizmente, posso falar com propriedade causa o que é ter uma relação paterna-filial reconhecida pelo Estado, pois foi exatamente essa a sensação que eu e meu pai experimentamos quando foi a nossa vez de pleitear o nosso reconhecimento.

Ester

13 anos, moradora do Rio de Janeiro

Tiago

15 anos, morador do Rio de Janeiro

Quando você foi adotado? Em 2019.

Porque você estava acolhido? Isso eu não sei direito, mas tenho uma ideia, acho que fui acolhido porque meus pais não tinham condição de ficar comigo.

Como é sua família? Minha família é composta pelo meu pai, ele é do tipo sem brincadeira comigo. Minha mãe tem um grande coração, ela é muito boa para mim. A melhor mãe que já tive. E ainda tem minha avó, ela é muito legal, gente boa à beça. Sempre pergunta por mim…

O que você entende que mudou na sua vida com a adoção? O modo em que eu vivia mudou. Eu tinha uma liberdade ruim, eu podia fazer o que bem quisesse. Sem que ficassem preocupados com o que estava acontecendo comigo, ou o que eu estava fazendo. Aqui a liberdade mudou, melhorou muito a minha vida, pois sei que tenho alguém se preocupando comigo.

A adoção representa muito na minha vida.

Colaboração: Barbara Toledo, fundadora do Quintal de Ana, um dos primeiros grupos de apoio à adoção do Brasil.

Leia também:

Dia 11 estreia a série “Adoções”

ADOÇÕES I – Família Harrad Reis

ADOÇÕES II – Do direito à convivência familiar e comunitária

ADOÇÕES III – Obrigações de cuidado

ADOÇÕES IV – Condições para adoção

ADOÇÕES V – O processo de adoção

ADOÇÕES VI – Cadastro Nacional de Adoção

ADOÇÕES VII – Adoção no Brasil

ADOÇÕES VIII – Adoções Internacionais

ADOÇÕES IX – Adoção Internacional 

ADOÇÕES X – Famílias