Lindôra muda tom da PGR e intensifica estratégia para blindar Bolsonaro
Escalada pode livrar presidente da reabertura de investigações em caso de perder a eleição
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8.ago.2022 às 13h00
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José MarquesMarcelo RochaBRASÍLIA
Com a proximidade do fim do primeiro mandato de Jair Bolsonaro (PL), a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, elevou o tom nas defesas que faz ao STF (Supremo Tribunal Federal) pelo arquivamento de apurações que envolvem o presidente e seus aliados.
A escalada tem sido vista dentro do Ministério Público Federal como uma tentativa de blindar Bolsonaro e evitar a reabertura de investigações contra ele caso perca as eleições.
Consequentemente, em caso de reabertura dessas apurações, haveria margem para questionar na Justiça o trabalho da PGR (Procuradoria-Geral da República), comandada por Augusto Aras.
No ano passado, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, arquivou uma ação de senadores contra Aras por suposta prevaricação, mas afirmou que isso não eliminaria a possibilidade de novo processo “na hipótese de surgimento de novos elementos”.
Posicionamentos de Lindôra resultaram em críticas do próprio Moraes e também da cúpula da CPI da Covid, que a chamou de “testa de ferro” de Aras. Procurada pela reportagem, a vice-procuradora-geral não se manifestou.
Lindôra é o braço direito de Aras na PGR mesmo antes de ocupar o posto de vice, cargo para o qual foi nomeada em abril deste ano. Ela tomou a linha de frente em momento de alinhamento com Bolsonaro e tem assumido o desgaste político do órgão.
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É um nome que tende a ser considerado pelo Palácio do Planalto para o comando do Ministério Público Federal caso Bolsonaro seja reeleito.
No final de julho, por exemplo, Lindôra pediu ao STF o arquivamento de 7 das 10 apurações preliminares abertas após a conclusão dos trabalhos da CPI da Covid no Senado. Cinco desses procedimentos incluem crimes atribuídos a Bolsonaro pela comissão parlamentar.
A subprocuradora usou argumentos que vão além da falta de provas para que as apurações sejam encerradas. Disse que não há indícios de crimes, argumento que dificultaria a reabertura de um novo processo a respeito das suspeitas apontadas pela CPI.
No procedimento que pedia a investigação de Bolsonaro por suspeita de prevaricação, Lindôra afirmou que “todos os fatos apontados foram exaustivamente analisados e deles não se extrai minimamente a prática delitiva imputada”.
Acrescentou que não há qualquer outra medida a ser realizada para apurar se houve delito, a não ser as já realizadas pela CPI, pela Polícia Federal e pelo Ministério Público.
Isso também foi dito de forma similar no procedimento que pedia abertura de inquérito por suspeita de emprego irregular de verba pública, de epidemia com resultado de morte e de infração de medida sanitária preventiva.
Na apuração preliminar sobre a suspeita de charlatanismo, Lindôra foi além. Disse haver indicação que “o presidente da República Jair Messias Bolsonaro tinha plena convicção e confiança na eficácia do tratamento para a Covid-19 com a utilização de cloroquina e hidroxicloroquina, aliado ao seu conhecimento de pendência comprobatória médico-científica para esse propósito”.
“O agente que age sinceramente acreditando nos recursos de tratamento poderá até ser tido com inculto, mas não charlatão”, afirmou a vice-PGR.
A defesa dos arquivamentos de investigações com base no entendimento de ausência de ilegalidade após “exaustiva” apuração seria, segundo um membro do Ministério Público, uma estratégia para “esvaziar as gavetas” em vez de engavetar os casos.
A manifestação mais forte de Lindôra foi apresentada no último dia 1º, em pedido para arquivar inquérito que apura a conduta de Bolsonaro por vazar dados de investigação sobre ataque ao sistema do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em 2018.
A PF concluiu que houve irregularidade na divulgação das informações.
Aras já havia solicitado o arquivamento dessa investigação em fevereiro deste ano, mas Moraes fez novas determinações à PF nos autos.5 10
Augusto Aras, procurador-geral da República
Em seu pedido de arquivamento, Lindôra reclamou de Moraes e disse que, ao não arquivar o inquérito, o ministro violou o sistema acusatório.
Ela também criticou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) –que apresentou ação contra as manifestações da PGR– e disse que Aras vem sofrendo “tentativas de constrangimento, intimidação e pressão” em sua “atuação independente”.
Moraes rebateu no último dia 5. Ele negou o pedido de arquivamento sob o argumento de que foi feito fora do prazo e que houve incompatibilidade entre a solicitação e manifestações anteriores feitas por Lindôra, em “inusitada alteração de posicionamento”.
Antes de assumir o posto de vice-PGR no início deste ano, a subprocuradora atuou em investigações relacionadas ao emprego de verbas federais para o enfrentamento da pandemia e que miraram governadores, casos sob a responsabilidade do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Um dos alvos da Procuradoria foi o ex-governador fluminense Wilson Witzel (PSC), antes aliado e que se tornou desafeto da família Bolsonaro. Foram apresentadas quatro denúncias contra Witzel.
Integrantes da PGR afirmaram que o teor das manifestações de Lindôra sobre as apurações preliminares decorrentes do relatório final da CPI era esperado frente ao histórico favorável a Bolsonaro nas manifestações do órgão relativas a suspeitas atribuídas ao presidente.
Em um grupo de integrantes da Procuradoria no WhatsApp circulou uma publicação do perfil humorístico Sensacionalista que dizia “Defesa Civil interdita prédio da PGR por sobrepeso nas gavetas e risco de desabamento”.
Há entre subprocuradores uma preocupação com o 7 de Setembro. Bolsonaro tem convocado apoiadores a irem às ruas e quer fazer da celebração do Bicentenário da Independência um ato eleitoral.
Ele determinou às Forças Armadas mudança de hora e local do desfile militar previsto para ocorrer no Rio de Janeiro para permitir conciliar com o evento que ocorrerá pela manhã em Brasília.
O caso foi levado ao Supremo pela Rede Sustentabilidade. O partido de oposição afirmou que a mudança não tem razão técnica, mas atende a “vontades político-eleitorais” do chefe do Executivo.
Relatora da ação na corte, a ministra Cármen Lúcia determinou na sexta-feira (5) que a Presidência da República preste informações, em cinco dias, a respeito da alteração. É de praxe nesses casos que, em seguida, o assunto seja enviado à PGR para manifestação.