O Estado fascista que gera violência – por Siro Darlan

Cartaz em muro com os dizeres esse Estado é nazista , fascista Local: São Paulo – SP Data: 05/2016 Codigo: 04AT490 Autor: Alexandre Tokitaka

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O Estado fascista que gera violência – por Siro Darlan

 MAZOLA8 horas ago  0  5 min read

Por Siro Darlan –

É triste ouvir as críticas de alguns governantes e “especialistas” em segurança pública contra os argumentos apresentados pelo Ministro Edson Fachin, ilustre relator da ADPG 635 que exige respeito aos cidadãos pobres e moradores das favelas.

O clamor dessas pessoas diz bem de sua incapacidade de gerir os bens públicos e tratar as pessoas com dignidade. Não enxergam que ao contrariar uma medida que não impede que os policias atuem, mas exige que respeites a Constituição e as leis do país.

Os doutores Luiz Edson Fachin e Ricardo Lewandowski. (ANPr)

Afinal, a segurança é um bem jurídico vital garantia dos demais bens jurídicos fundamentais da vida humana, mas jamais se sobrepõe ao direito e ao princípio da liberdade.

A liberdade é a primeira das seguranças. A ideia de defesa e garantia da legalidade a par da garantia dos direitos do cidadão conduz-nos a repensar a função da Polícia dentro do arquétipo constitucional e submetê-la ao cumprimento integral dos desígnios constitucionais que têm reflexão e refração na legislação infraconstitucional e no Direito.

Como escreveu Gomes Canotilho e Vital Moreira, a defesa e a garantia dos direitos dos cidadãos impõe-se à Polícia como uma “obrigação de proteção pública dos direitos fundamentais”, cuja prossecução se deve articular com o direito à segurança. À Polícia cabe, constitucionalmente, a função de “defesa da legalidade democrática, isto é, garantir o “respeito e cumprimento das leis em geral, naquilo que concerne à vida da coletividade. Se lhe cumpre tão nobre missão, não pode a mesma apartar-se da legalidade que defende e garante sob pena de se esboroar a legitimidade da sua ação diária, ou seja, a Polícia deve obediência à lei e à constituição.

Durante caminhada pelos becos, ruas e vielas do Jacarezinho, o líder comunitário Rumba Gabriel relatou casos de abusos cometidos pela PM. (Daniel Mazola/Tribunada Imprensa Livre)

Em Estado de direito democrático assente na dignidade da pessoa humana e na vontade popular, como propósito e ideológico e pragmático da construção de uma sociedade livre, justa e solidária exige uma Polícia que tenha como interesse e fim não0 só garantir a segurança interna, mas que promova o respeito e a garantia dos direitos fundamentais da pessoa na pugna pela paz jurídica.

A Constituição de 1988 afirma que “a casa é asilo inviolável do indivíduo” e considera crime a entrada na residência de uma pessoa sem sua permissão, exceto em três casos: quando houver um desastre, se um flagrante delito estiver acontecendo no domicílio, ou se for dada uma ordem judicial para isso. Nas favelas do Rio de Janeiro, contudo, a Constituição tem sido brutalmente afrontada por policiais. Há anos, eles adentram as casas, sem autorização dos donos, às vezes cometendo furtos, e outras ações criminosas, como relatam os moradores das favelas invadidas.

O deputado Ulysses Guimarães presidiu a Assembleia Constituinte que formulou a Carta Magna. (Reprodução/FGV)

Com o pretexto de frear o banditismo, operações planejadas ou emergenciais das forças de segurança se tornaram rotineiras. Calcula-se que, entre janeiro de 2007 e setembro de 2024, houve uma média de 105 delas por mês na Região Metropolitana do Rio. Os agentes estatais se lançaram principalmente sobre comunidades de baixa renda para apreender drogas e armas, resgatar mercadorias roubadas, executar mandados de prisão, desfazer barricadas e retaliar ataques de criminosos. As investidas, não raro, desencadearam tiroteios, que provocaram lesões e mortes, além de grandes prejuízos à educação de crianças e jovens e à saúde da população. Conforme levantamento, de 2007 até setembro de 2024, as operações no Rio e nas redondezas da cidade feriram 27 pessoas e mataram 33, em média, por mês.

Os abusos de autoridade costumam eclodir justamente ao longo dessas incursões. Não à toa, o Ministério Público do Estado mantém um plantão que as fiscaliza. Entre maio de 2021 e novembro de 2024, o órgão contabilizou 58 denúncias de invasões domiciliares pelas polícias Militar ou Civil. Os episódios se deram tanto na capital quanto em São Gonçalo, na Baixada Fluminense e em Niterói. O Complexo da Maré – um aglomerado de quinze favelas cariocas – também monitora operações policiais, mas apenas as que o atingem.

De 2016 até o início de dezembro passado, as forças de segurança violaram pelo menos 278 casas por lá.

SIRO DARLAN – Advogado e Jornalista; Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Ex-juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), aposentado compulsoriamente por conceder benefício a preso em risco de vida, que uma vez preso faleceu nas grades da crueldade estatal; Especialista em Direito Penal Contemporâneo e Sistema Penitenciário pela ENFAM – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados; Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo; Membro da Comissão da Verdade sobre a Escravidão da OAB-RJ; Membro da Comissão de Criminologia do IAB. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.

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