Excelentíssimo Senhor Doutor Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Luiz Fux.
Distribuição por prevenção ao Ministro Edson Fachin
(HC 183.803, HC 183.807, HC 187.043 e HC 190.547)
Geraldo Prado, Carlos Eduardo Machado, João Pedro Drummond e Ignácio Machado, advogados inscritos na OAB/RJ respectivamente sob os nos 46.484, 46.403, 206.955 e 229.767[1], vêm, com fundamento no art. 5º, LXVIII e no art. 102, I, “i”, ambos da Constituição Federal, bem como nos arts. 647 e ss. do Código de Processo Penal, impetrar a presente ordem de
HABEAS CORPUS
(com pedido liminar)
em favor de Siro Darlan de Oliveira, brasileiro, casado, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, lotado na 7ª Câmara Criminal[2], apontando-se como autoridade coatora a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que, por meio dos acórdãos anexos3, recebeu e, rejeitando embargos de declaração opostos pelo paciente, manteve o recebimento de denúncia oferecida em seu desfavor na APN 951/DF, deixando de reconhecer a ilegalidade que vicia a investigação desde a sua origem, pois instaurada com base material exclusiva em atos de colaboração premiada negociada mediante usurpação de atribuição e de competência.
ÍNDICE DO HABEAS CORPUS
- INTRODUÇÃO ……………………………………………………………………Página 3
- DO PACIENTE …………………………………………………………………….Página 9
- DA CRONOLOGIA DOS FATOS …………………………………………..Página 18
- Tratativas iniciais…………………………………………………….Página 22
- Gravações produzidas com apoio
e sob orientação do MPRJ e de DPF…………………………….Página 30
- Decisão do STJ de 2016………………………………………….Página 56
- Gravação da advogada Nathalie Anselmo
e Termo de Colaboração nº 10…………………………………….Página 60
- Envio tardio do material ao STJ……………………………….Página 68
- Instauração do INQ 1.199/DF………………………………….Página 71
- Desenrolar da investigação……………………………………Página 73
Gráfico com linha do tempo resumida…………………………Página 76
- DO CONSTRANGIMENTO ILEGAL…………………………………………Página 77
- DO DIREITO…………………………………………………………………………Página 89
- Prerrogativa de foro, garantia constitucional………….Página 91
- Usurpação de atribuição e de competência…………Página 94
- Gravações umbilicalmente ligadas à delação……Página 96
- HC 151.605/PR……………………………………………………..Página 99
- Necessidade de trancamento do INQ 1.199/DF
e da APN 951/DF …………………………………………………………Página 101
- PEDIDO LIMINAR…………………………………………………………………Página 114
- PEDIDO………………………………………………………………………………Página 117
ÍNDICE DE DOCUMENTOS………………………………………………………Página 118
1. INTRODUÇÃO
Vivemos tempos em que teorias, antes vistas como
conspiratórias, provam-se pequenas frente à realidade.
Nos últimos meses, o feio subterrâneo do mundo das
investigações criminais emergiu diante de nossos olhos na forma de uma enxurrada de mensagens, revelando que os autos de um inquérito não encerram o seu todo.
Em verdade, parte considerável do atuar dos órgãos
públicos investigativos se realiza extraoficialmente, em reuniões sem ata nem registro ou, nas raras vezes em que deixa vestígios, por meio de aplicativos de mensagens tais como o WhatsApp ou Telegram.
Justamente nesse espaço não oficial, não fiscalizável e,
por isso mesmo, de aparente anomalia jurídica, são tomadas, por vezes, decisões sem o menor respaldo na legalidade, inclusive contrariando-a.
Foi o que aconteceu na Lava Jato, quando os Procuradores de Curitiba planejaram retaliar desembargador que decidira contrariamente aos seus projetos e investigar subterraneamente Ministros do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), ignorando deliberadamente o fato de todas essas autoridades estarem fora de suas atribuições investigativas.
Foi o que aconteceu, também, em operação de
proporções bem menores, a Operação Betrug, deflagrada na pequena cidade de Resende-RJ, após o Desembargador Siro Darlan de Oliveira, ora paciente, proferir decisão liminar em habeas corpus contrariando os interesses do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (“MPRJ”).
Por haver colocado o investigado Ricardo Abbud em
liberdade, o paciente, apesar de sua prerrogativa de foro no STJ, tornou-se ele próprio investigado por Promotores que atuam junto à 1ª Instância e, portanto, sem atribuição para investigá-lo.
Isso é fato, admitido pelo colaborador premiado Crystian Guimarães Viana quando ouvido no PAD n. 0006926-94.2018.2.00.0000, em trâmite no Conselho Nacional de Justiça (“CNJ”)[3]:
Sr. Crystian Guimarães Viana – [00:06:09, PARTE 1] Nós tivemos provavelmente umas seis reuniões aqui no Ministério Público do Rio e no Ministério Público de Resende, na qual foi levantado várias questões desse processo criminal anterior, que eu sou réu, e uma das perguntas, na verdade, salvo engano, a pergunta final de um dos promotores era sobre a questão do HC do Ricardo Abbud, se eu sabia de alguma coisa.
Após, Crystian Viana, por orientação dos Promotores de Justiça de Resende e mesmo de Delegado de Polícia Federal – com o qual manteve intensa troca de mensagens via WhatsApp – se pôs a gravar seus conterrâneos com equipamentos fornecidos pela Subsecretaria de Inteligência do Estado do Rio de Janeiro, assim produzindo elementos para corroborar sua delação.
Colaboração essa que, em mais uma violação à
prerrogativa de foro do paciente junto ao STJ, acabou homologada por Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (“TJRJ”).
Foi assim que promotores do MPRJ com atuação na 1ª Instância, utilizando-se de colaborador premiado para delatar quem eles queriam ver delatado, depois o orientando e fornecendo equipamentos para gravar outras pessoas durante meses, até mesmo sua própria advogada, conseguiram, de forma subterrânea, conduzir investigação preliminar e extraoficial contra o Desembargador Siro Darlan de Oliveira.
Quando enfim julgaram obter elementos de corroboração
suficientes, enviaram seus “achados” que nada tinham de fortuitos ao STJ, onde foi instaurado o INQ 1.199/DF e, a partir dele, ajuizada a APN 951/DF.
Trata-se, portanto, de ação penal natimorta, fruto de
investigação contaminada desde a origem pelos vícios da usurpação de atribuição e de competência.
Tudo isso é fato e foi demonstrado repetidamente pela
defesa do paciente tanto ao longo do INQ 1.199/DF – em duas petições que restaram ignoradas, ensejando inclusive a impetração de habeas corpus por ausência de prestação jurisdicional (HC 187.043) –, quanto na APN 951/DF, primeiramente em sede de resposta à acusação e, depois, nos embargos de declaração opostos contra a decisão que recebeu denúncia.
Esta 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (“STF”) já teve a
oportunidade de enfrentar questão jurídica idêntica.
No HC 151.605/PR, impetrado em favor do ex-Governador
do Paraná Carlos Alberto Richa, esta Turma entendeu que a usurpação de atribuição e competência não poderia ser tolerada por constituir afronta à própria Constituição Federal.
Decidiu, assim, pela ineficácia de todos os atos e
elementos produzidos na colaboração premiada em relação ao delatado cujo foro por prerrogativa de função restou desrespeitado, bem como pelo trancamento da investigação instaurada exclusivamente a partir daqueles elementos.
Ao presente caso deve ser dada a mesma solução
jurídica adotada no HC 151.605/PR, pois idêntica ilegalidade deu origem ao inquérito a partir do qual se ofereceu denúncia na APN 951/DF.
No entanto, não obstante ter reconhecido a ilegalidade
na homologação do acordo de colaboração de Crystian Guimarães Viana, a Corte Especial do STJ deixou de reconhecer ineficácia dos atos decorrentes do referido acordo no que tange ao paciente.
A autoridade coatora contrariou o entendimento da Segunda Turma do STF, e decidiu que a ilegalidade da homologação apenas surte efeitos entre os celebrantes, mas não em relação à autoridade cuja prerrogativa de foro restou desrespeitada.
Além disso, concluiu que as gravações ambientais
realizadas pelo colaborador em Resende/RJ, na primeira metade de 2016, não guardariam qualquer relação com sua colaboração premiada, mesmo diante de estar amplamente evidenciado nos autos que Crystian havia sido orientado por membros do MPRJ a gravar os demais investigados com o fito de corroborar seus relatos, utilizando para isso equipamentos do Estado.
A conclusão da Corte Especial do STJ simplesmente não é
admissível frente à realidade dos fatos e dos autos. Na verdade, contraria frontalmente todas as evidências constantes do processo!
Esta impetração busca, portanto, finalmente pôr fim ao
manifesto constrangimento ilegal que o Desembargador Siro Darlan de Oliveira vem sofrendo já há quatro anos, desde a instauração do INQ 1.199/DF a partir de elementos obtidos ilegalmente.
Como se verá ao longo do presente habeas corpus, está
provado nos autos da APN 951/DF que:
- Promotores de Justiça com atuação na 1ª Instância, logo sem atribuição para investigar o paciente, Desembargador do TJRJ com prerrogativa de foro junto ao STJ, foram os responsáveis por provocar Crystian Guimarães Viana a incluir Siro Darlan na sua delação premiada ainda nas primeiras tratativas do acordo de colaboração, ocorridas em dezembro de 2015 e janeiro de 2016; e
- O INQ 1.199/DF foi instaurado com base material exclusiva nos atos de colaboração da delação premiada de Crystian Viana, não podendo ser as gravações dissociadas do processo de negociação e celebração do acordo, uma vez que o colaborador foi orientado e auxiliado pelas autoridades a realizar gravações como forma de fortalecer o seu acordo, utilizando até mesmo equipamentos fornecidos pela Subsecretaria de Inteligência do Estado do Rio de Janeiro.
Frise-se, desde logo, a desnecessidade de qualquer
aprofundamento da matéria fático-probatória da ação penal originária, não sendo a pretensão do presente writ abordar o mérito da acusação que lhe recai, mas, tão somente o histórico de instauração do INQ 1.199/DF, cuja base material exclusiva são atos da colaboração de Crystian Viana, e a partir do qual a denúncia da APN 951/DF foi oferecida.
O que se questiona aqui é, primariamente, a francamente
inadmissível conclusão da Corte Especial do STJ, contrariando todas as evidências presentes nos autos, no sentido de que as gravações produzidas por Crystian Guimarães Viana seriam dissociadas do processo de negociação e celebração de sua colaboração premiada.
O erro dessa conclusão poderá ser constatado de plano
por Vossa Excelência, a partir da mera leitura deste writ e análise superficial dos documentos que o instruem, todos constantes nos autos da APN 951/DF.
Antes, porém, cumpre tecer breves comentários sobre o
próprio paciente e sobre descobertas das investigações desfavoráveis à hipótese acusatória, mas que, seletivamente, foram deixadas de lado.
Embora não tratem do mérito deste HC em si, essas notas
introdutórias são essenciais para se entender como uma investigação e uma ação penal natimortas chegaram tão longe.
2. DO PACIENTE
O paciente é o 37º Desembargador mais antigo do Tribunal de Justiça Fluminense e sempre pautou sua judicatura na moralidade, humanidade e, sobretudo, na obediência aos direitos fundamentais mesmo pelos abandonados pela ordem econômica.
Mais recentemente, em março do ano passado, quando
se tomava consciência da inevitável crise sanitária que seria causada pela pandemia do COVID-19, Siro Darlan proferiu 30 decisões colocando em regime domiciliar menores infratores e presos em regime semiaberto a fim de mitigar e reduzir as perdas humanas[4].
Por remar há tantos anos na direção oposta à maré
punitiva contra a camada mais desfavorecida da população, filosofia que afeta algumas instituições da Justiça Estadual, onde atuou durante toda a sua carreira, os posicionamentos de viés garantista e humanitário do paciente[5] lhe angariaram grande antipatia de alguns setores da alta burocracia estatal, notadamente do Ministério Público estadual.
As represálias suportadas já foram de ordens diversas,
algumas, por sinal, como se verá logo adiante, originaram demandas indenizatórias reconhecidas pelo Poder Judiciário, datadas da época em que Juiz da Vara de Infância e Juventude do Rio de Janeiro.
Sua atuação naquela Vara foi marcada pela proteção
dos direitos dos menores infratores tendo sido condecorado com a Medalha Tiradentes[6], uma das maiores honrarias de nosso estado, por seu notório serviço à sociedade.
Além disso, o paciente é conhecido no meio jurídico pelo
seu estilo de vida simples, rigorosamente estoico e comprometido com a
caridade. Jamais ostentou bens de luxo ou se colocou em situação de lazer financeiramente incompatíveis com seus vencimentos.
Na ação penal que tramita em seu desfavor, esse fato foi
materializado em prova pericial/contábil8, apresentada com a sua resposta preliminar, qual seja, Relatório de Perícia Técnica Financeira realizado pelo Sr. José Lessa Abreu, renomado perito contábil9, cujo objeto, em síntese, consistiu na análise da evolução patrimonial e das movimentações bancárias do Paciente e de sua esposa.
A conclusão não poderia ser mais clara: “após devida
análise, com base nos documentos apresentados, chegou-se ao convencimento técnico que, nos exercícios analisados, a variação patrimonial do Contratante está compatível com seus rendimentos declarados ao fisco. Isto é, de outro modo, em nenhum dos exercícios analisados há evidência de patrimônio a descoberto”; e“Diante dos extratos apresentados à exame, e após as justificativas e as amostras de documentos juntados neste Parecer, a Perícia não encontrou evidências de créditos relevantes de origem suspeita nas contas analisadas”.
- Peça nº 6 – Parecer contábil elaborado por José Lessa Abreu.
- Sócio-diretor do Centro de Perícias Contabilidade e Consultorias Empresarias – CPCE, Perito
Contábil cadastrado no CNPC (Conselho Nacional de Peritos Contábeis) do CFC (Conselho
Federal de Contabilidade) sob o número 4087, bacharel em Ciências Contábeis, pela Universidade Cândido Mendes, registrado no Conselho Regional de Contabilidade do Rio de
Janeiro sob o no 59.187/O, pós-graduado pela Fundação Getúlio Vargas – EBAP-RJ, no “MBA – Administração Avançada de Negócios”, com experiência profissional constituída por 30 anos de atividades e trabalhos na apuração e prevenção de fraudes financeiras, incluindo 25 anos de efetivos trabalhos como Perito Criminal da Polícia Civil do Rio de Janeiro, na especialidade “Perícias de Contabilidade” com atividades envolvendo exames periciais em crimes financeiros nas esferas Judicial e Criminal, do Instituto de Criminalística Carlos Éboli.
A prova produzida afasta peremptoriamente a narrativa
ministerial. Não há como se cogitar qualquer recebimento ilícito por parte do Paciente fora do campo das ilações.
Em verdade, a APN 951/DF é resultado de longa
perseguição dirigida contra o paciente.
As desavenças com membros do Parquet remontam ao
ano de 2005, pouco tempo após o paciente deixar a 1ª Vara da Infância e Juventude do Juizado de Menores do Rio de Janeiro e ser promovido ao cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
No dia 9 de maio daquele ano, o hoje Procurador de Justiça Marcio Mothé, acionado oficiosamente pelo organizador de uma festa rave que era alvo de fiscalização, teria dito, dirigindo-se à equipe policial: “Que palhaçada é essa? Vamos acabar logo com este circo. (…) A era Siro Darlan acabou. Não há motivos para esse tipo de palhaçada”.
Os impropérios levaram a que o integrante do Ministério Público fluminense fosse condenado pelo crime de injúria no Órgão Especial do Tribunal de Justiça Fluminense[7]. Acerca do fato, também foi julgada procedente demanda em favor do Paciente reconhecendo o dano moral e fixando indenização em pecúnia, tendo sido a sentença confirmada em segundo grau[8].
Merece destaque, ainda, outra ação indenizatória
movida pelo paciente, dessa vez não contra um membro do Ministério Público, mas em face da Fazenda Pública do Estado do Rio de Janeiro, por conta de manifestação institucional subscrita por um grupo de quatro promotores de justiça, à época oficiantes nas Varas da Infância e Juventude da Comarca da Capital, intitulada “Carta Aberta a Classe”.
Estes são apenas dois dos mais emblemáticos episódios
ilustrando o ressentimento entre o Ministério Público e o paciente, atribuído muito provavelmente a seus posicionamentos firmes e garantistas.
É de se notar ainda o expediente de vazamentos de
informações contra o Desembargador Siro Darlan ocorrido até mesmo em diversos momentos da presente persecução penal.
Via de regra, os veículos de imprensa obtêm informações
sobre a investigação e ação penal antes do paciente, o que foi objeto de notícia de crime oferecida pela AMAERJ – Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro[9], solicitando ao Procurador-Geral da República providências na apuração e identificação dos responsáveis pelos vazamentos.
Lamentavelmente, hoje já é de conhecimento público o
fato de os membros dos órgãos de persecução atuarem oficiosamente contra magistrados que contrariam seus objetivos.
Em seu voto pela concessão da ordem no Habeas Corpus 164.493/PR, exarado ainda em Sessão do dia 09 de março de 2021 da 2ª Turma do STF, o Ministro Gilmar Mendes apontou a troca de mensagens entre membros da FT Lava Jato que demonstravam articulações arquitetadas para retaliar os magistrados que decidiam em favor dos acusados em questão[10].
Ao comentar os excessos na manutenção das prisões
provisórias decretadas por aquela 13ª Vara Federal de Curitiba, o Ministro Gilmar Mendes citou ainda perseguição encetada contra o Ministro Marcelo Navarro Ribeiro Dantas:
“[…] Agora, os fatos vêm a revelar, a partir dessas informações da Vaza-Jato, que aquele juiz sofreu um grande massacre a partir das ações dos Procuradores. […] Os magistrados que eventualmente concedessem um Habeas Corpus corriam o risco de serem massacrados nesse conúbio vergonhoso que se estabeleceu entre a mídia e os Procuradores.”[11]
O Ministro Gilmar Mendes expôs, ainda, a forma espúria
como se davam as negociações estabelecidas entre colaborador premiado e Ministério Público Federal, no qual o órgão efetivamente escolhia o que e quem seria inserido na delação, assim permitindo a perseguição de
adversários[12].
A perseguição contra o Desembargador Siro Darlan no
presente caso, apesar da fragilidade probatória que marca o procedimento desde o seu início, é flagrante.
Após duas buscas e apreensões, bem como decretação
de quebra de sigilo dos dados telefônicos em desfavor do paciente, nenhum dos elementos colhidos confirmou o anêmico relato de Crystian Guimarães Viana, segundo o qual teria “ouvido dizer” que o paciente vendera decisão liminar proferida em plantão.
Muito pelo contrário. Dos elementos coligidos até a
presente data é possível inferir, no máximo, que determinados indivíduos se aproveitaram de uma antiga proximidade pessoal com o paciente para, sem qualquer ciência deste, investirem-se artificialmente na posição de seu emissário, confortados pela posição garantista e libertária do paciente, conhecido por sua posição contrária à banalização da prisão preventiva e sua malversação como instituto antecipador da pena.
A própria investigação tratou de desvendar episódio em
que a banca quebrou os apostadores!
No habeas corpus impetrado em benefício de Leandro Bastos, objeto da troca de mensagens de Mayson César e um dos coacusados, e que a título hipotético estaria sendo negociado com o paciente, este votou pela denegação da ordem, o que levou à inusitada devolução de quantia expressiva pelo coacusado.
O coacusado precisou devolver R$ 250 mil ao advogado
do suposto miliciano após o Desembargador votar contrariamente à sua libertação. Eis a transcrição do áudio enviado pelo advogado ao coacusado[13]:
“Bom dia, amigo, tudo bem? Olha só, os meninos lá pediram pra ver como é que vão fazer pra devolver os recursos, eles não querem mais tocar. Ficaram um pouco chateados que o doutor Siro também não votou a favor, enfim, a facilidade que não veio. Aí ele queria ver direitinho como é que a gente faz para pra combinar pra pegar de volta, como é que a gente vai fazer isso aí, tá? (…)”
O valor devolvido é cinco vezes superior ao valor
envolvido na hipotética negociação da decisão objeto da APN 951/DF.
Por que o paciente se venderia por R$ 50 mil, mas não por R$ 250 mil? Não faz o menor sentido e não se venderia por dinheiro algum.
O evento foi mencionado no voto vencedor do
julgamento de recebimento a denúncia, sendo lícito inferir que a menção ao “miliciano” influenciou os demais colegas da Corte Especial.
Contudo, logo o mais essencial não foi explicitado no voto:
que a negociação havia sido infrutífera em razão da decisão do paciente contrária aos anseios dos personagens envolvidos na situação.
O episódio do habeas corpus em favor de Leandro Bastos
é a típica prova cabal contra a tese acusatória.
Esse evento, libertado do enviesamento inicial, não tem
como levar a outra conclusão que não seja o fato de que, se decisões do paciente eram objeto de comércio, o eram sem o seu conhecimento e, claro, sem a sua anuência.
Na verdade, o voto do Ministro Napoleão Nunes Maia,
contrário ao recebimento da denúncia oferecida contra o paciente na APN 951/DF, expõe de forma bastante clara a única conclusão que se poderia extrair dos elementos obtidos na investigação originária17:
Todos os magistrados de todos os tribunais estão sujeitos a
isso, ainda mais em se tratando de Desembargador com perfil notoriamente garantista e padrão decisório pró-liberdade.
Feitas essas considerações sobre o histórico pessoal do
paciente, bem como de elementos sensíveis descobertos na investigação extremamente favoráveis ao paciente, mas completamente ignorados no voto condutor do acórdão de recebimento da denúncia, passe-se então aos fatos pertinentes à presente impetração.
Fatos esses, importante frisar, todos comprovados por
documentos constantes nos autos da APN 951/DF, sem qualquer controvérsia quanto a eles,e disponíveis para apreciação da Corte Especial do STJ quando da prolação dos atos coatores.
3. DA CRONOLOGIA DOS FATOS
Os fatos que antecederam a instauração do INQ 1.199/DF
serão a seguir narrados cronologicamente, para facilidade de compreensão.
No entanto, a cronologia dos fatos não se revelou à
defesa do paciente de uma só vez. Com o passar do tempo, foi-se tomando conhecimento de diversos documentos não enviados pelo MPRJ ao Superior Tribunal Justiça, fazendo imediatamente sua juntada aos autos.
Esses documentos revelam que Crystian Guimarães Viana,
muito mais do que um mero colaborador premiado, tornou-se verdadeiro instrumento de investigação dos promotores de Resende-RJ e também de Delegado da Polícia Federal, que o orientaram a gravar os demais investigados na Operação Betrug, forneceram equipamentos para tanto e, até mesmo, provocaram a inclusão do paciente na sua delação premiada.
Crystian Guimarães Viana, durante meses, agiu como
longa manus do MPRJ e da Polícia Federal, que por meio dele conduziram ampla investigação extraoficial e subterrânea.
Investigação para a qual não possuíam atribuição para
conduzir, pois realizada em processo de negociação e celebração de colaboração premiada que, por provocação deles próprios, envolvia Desembargador do TJRJ desde as suas primeiras tratativas.
Nesse contexto é que foram produzidos os elementos de
colaboração premiada posteriormente remetidos ao STJ, utilizados como base material exclusiva para instaurar o INQ 1.199/DF.
Inicialmente, a defesa do Des. Siro Darlan tomou
conhecimento apenas do Termo de Colaboração nº 10 da delação premiada de Crystian Viana, lavrado em junho de 2016, e de duas gravações efetuadas pelo colaborador nos meses anteriores de conversas com o advogado Marcelo Macedo e com sua própria advogada Nathalie Anselmo.
Em outubro de 2019, a própria defesa juntou aos autos do INQ 1.199 cópia audiovisual de depoimento prestado por Crystian em
Procedimento Administrativo Disciplinar no CNJ (PAD nº 000692694.2018.2.00.0000), no qual afirmara ter delatado o Des. Siro Darlan por expressa provocação de Promotor de Justiça sem atribuição para investigar o ora paciente.
A petição foi ignorada.
Após o ajuizamento da APN 951/DF, com a apresentação
da reposta preliminar do corréu Ricardo Abbud, descobriu-se que, na realidade, já em 1º de fevereiro de 2016 havia sido subscrito por Crystian e pelos promotores de Resende o relato versando sobre o paciente, de teor idêntico àquele datado de quatro meses depois.
A maior revelação documental, entretanto, ocorreu
apenas depois do recebimento da denúncia pela Corte Especial do STJ e da oposição dos embargos de declaração.
Em dezembro de 2020, a defesa de Siro Darlan descobriu
a existência da Ação Penal nº 0054858-83.2017.8.19.0000, em trâmite no 2º Grupo de Câmaras Criminais do TJRJ, até então sob segredo de Justiça.
Neste processo, o próprio MPRJ apresentou anexo
contendo páginas e páginas de gravações realizadas por Crystian Viana e, ainda, de conversas mantidas via WhatsApp entre o colaborador e um Delegado de Polícia Federal desde janeiro de 2016.
Nessas conversas fica claro que as gravações
apresentadas por Crystian Guimarães Viana não foram feitas espontaneamente, tampouco são dissociadas do processo de negociação de sua colaboração premiada, mas foram realizadas, na verdade, com o incentivo, auxílio e orientação dos órgãos de investigação, a fim justamente de reforçar a sua colaboração premiada. Até os equipamentos utilizados nas gravações do advogado Marcelo em 28 de janeiro, foram fornecidos a mando dos promotores por Delegado de Polícia Federal, como se verá logo mais.
Assim, essa colaboração, mesmo envolvendo o paciente, Desembargador do TJRJ e, portanto, com prerrogativa de foro junto ao STJ, foi conduzida e celebrada com Promotores de Justiça de 1ª instância do MPRJ, sem a mínima atribuição para investigá-lo, bem como homologada por autoridade incompetente para tanto – outro Desembargador do TJRJ –, em espantoso desrespeito às normas constitucionais de competência jurisdicional.
Apesar da extensão da narrativa a seguir exposta, ao
mérito deste habeas corpus interessa, apenas e tão somente, a constatação de que as gravações ambientais realizadas por Crystian Viana estão umbilicalmente ligadas ao seu acordo de colaboração premiada, ao contrário da conclusão da autoridade coatora.
Essa constatação pode ser feita de plano, apenas com a
análise superficial dos fatos a seguir delineados a partir dos elementos, inclusive documentais, constantes dos autos da APN 951/DF.
3.1. Paciente incluído na colaboração premiada de Crystian Viana por provocação de Promotor de Justiça com atuação em 1ª instância.
Embora o INQ 1.199/DF, do qual a APN 951/DF se originou,
tenha sido instaurado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) somente em meados de 2017, o paciente começou a ser efetivamente investigado muito antes, entre os meses de dezembro de 2015 e janeiro de 2016, no âmbito da negociação da colaboração premiada ao final pactuada por Crystian Guimarães Viana com o MPRJ.
Em 29.10.2015, foi deflagrada a assim denominada “Operação Betrug”, com o objetivo de apurar suposta organização criminosa instalada na Câmara Municipal de Resende/RJ, resultando na prisão de, entre outros, Ricardo Abbud e Crystian Guimarães Viana.
Em 31.10.2015, reconhecendo a fundamentação
deficiente do édito prisional, o paciente proferiu decisão liminar, em sede de plantão, revogando a prisão preventiva de Ricardo Abbud.
Poucos dias depois, contudo, em razão de fatos outros,
ocorridos posteriormente à sua soltura[14], Abbud foi preso novamente.
Crystian Viana, por sua vez, ficou preso até 17.12.2015,
quando a 7ª Câmara Criminal do TJRJ reconheceu a ilegalidade das prisões preventivas decretadas no âmbito da “Operação Betrug”, tal como o paciente já havia feito em relação a Ricardo Abbud.
Apenas Abbud permaneceu preso, mas em razão de sua
segunda prisão, não da primeira.
Logo depois de sua soltura, Crystian Viana começou a
negociar acordo de colaboração premiada com o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e passou a auxiliar os Promotores de Justiça do GAECO/RJ, órgão do Ministério Público estadual, naquelas investigações.
Aqui começa a narrativa dos fatos mais relevantes para a
presente impetração.
Ouvido como testemunha no PAD nº 0006926-
94.2018.2.00.0000, em trâmite no CNJ, Crystian Guimarães Viana afirmou ter procurado o Ministério Público para negociar acordo de colaboração premiada após sair da prisão:
Sr. Crystian Guimarães Viana – [00:05:39, PARTE 1] O que aconteceu foi que eu procurei Ministério Público depois de ter sido liberado da prisão, procurei o Ministério Público para poder fazer um acordo de colaboração premiada, na qual, não sei se foi essa a pergunta que o senhor fez…
As transcrições das três partes do depoimento de Crystian Viana seguem anexas[15], estando nelas indicado hiperlink onde as gravações poderão ser vistas por Vossa Excelência.
Prosseguindo, Crystian declarou ter realizado por volta de
seis reuniões tanto no Ministério Público em Resende quanto na sede do MPRJ na capital do estado.
Nessas reuniões, foram feitas inúmeras perguntas a Crystian sobre os fatos apurados na Operação Betrug.
Mas não só sobre isso.
Conforme afirmado expressamente por Crystian Viana,
sob compromisso de dizer a verdade, a última pergunta feita por um dos promotores do MPRJ – autoridade, evidentemente, sem qualquer atribuição para investigar o ora paciente, Desembargador do TJRJ – foi “sobre a questão do HC do Ricardo Abbud, se eu sabia de alguma coisa”:
Sr. Crystian Guimarães Viana – [00:06:09, PARTE 1] Nós tivemos provavelmente umas seis reuniões aqui no Ministério Público do Rio e no Ministério Público de Resende, na qual foi levantado várias questões desse processo criminal anterior, que eu sou réu, e uma das perguntas, na verdade, salvo engano, a pergunta final de um dos promotores era sobre a questão do HC do Ricardo Abbud, se eu sabia de alguma coisa.
Não é preciso ser brindado por neurônios para perceber
que o promotor de Justiça não queria saber se Crystian Viana conhecia os fundamentos do Habeas Corpus, a jurisprudência nele citada, o número de páginas da peça ou qualquer trivialidade do tipo.
Sua intenção era clara: provocar o colaborador Crystian Viana a produzir elemento que incriminasse o Desembargador Siro Darlan de Oliveira – o qual, como já exposto, gozava de antipatia ostensiva do MPRJ em razão de sua postura garantista de longa data, ao menos desde quando exerceu o cargo de Juiz da 1ª Vara da Infância e Adolescência, preferindo ressocializar menores infratores a removê-los do convívio social.
Crystian destaca ainda que, em sua resposta à tal “última
pergunta” do Promotor do MPRJ, não lembrava qual era o nome do julgador que havia concedido a liminar em favor de Abbud.
Não que isso constituísse algum empecilho aos projetos do Promotor de Justiça inominado e sem atribuição para investigar o paciente, que tratou de informá-lo que o responsável pela concessão da medida liminar teria sido o Desembargador Siro Darlan:
Sr. Crystian Guimarães Viana – [00:10:42, PARTE 1] Quando o promotor me perguntou se eu sabia de algo sobre o HC do Ricardo foi o que eu contei a ele. Falei “olha, a gente estava em Bangu, ele veio narrando isso, inclusive narrando de uma forma natural”, mas eu não sabia quem era… quem era o nome do juiz e aí realmente depois ele foi falando que era o Siro Darlan, enfim… Mas isso, assim, de forma muito natural.
Mais adiante, ao responder as perguntas formuladas pela
defesa do ora paciente no PAD, Crystian confirma, de novo, que foi o Promotor de Justiça quem primeiro mencionou Siro Darlan:
Defesa do Des. Siro Darlan – Então o MP trouxe especificamente o nome do Desembargador Siro Darlan? Sr. Crystian Guimarães Viana – Sim.
Defesa do Des. Siro Darlan – Então quando o senhor firmou a delação, ela foi através de perguntas do MP, ou o senhor trouxe anexos para demonstrar a veracidade das informações?
Sr. Crystian Guimarães Viana – Você está dizendo somente sobre o caso específico ou sobre toda a delação? Defesa do Des. Siro Darlan – [00:15:42, PARTE 2] Sobre o caso específico.
Sr. Crystian Guimarães Viana – Somente respondendo a uma pergunta do promotor.
Defesa do Des. Siro Darlan – O senhor se recorda exatamente qual foi pergunta?
Sr. Crystian Guimarães Viana – Essa que eu acabei de falar. Se eu sabia de algo de como o Ricardo Abbud tinha conseguido um HC do Siro Darlan, de uma forma tão rápida.
Ao ser indagado se o promotor havia lhe explicado a
razão pela qual a concessão da medida liminar a Ricardo Abbud pelo Desembargador Siro Darlan levantara suspeitas, Crystian Viana negou categoricamente:
Defesa do Des. Siro Darlan – E o promotor chegou a esclarecer para o senhor que o HC foi dado em plantão e as decisões de plantão são dadas em um dia?
Sr. Crystian Guimarães Viana – Sim, sim. Que era uma questão do plantão, ok. Ele tinha falado, e eu tinha… [00:16:12, PARTE 2] o Ricardo também tinha falado. E eu… a questão de saber, também, que foi no domingo, provavelmente, que o Ricardo tinha conseguido esse HC. Então, no plantão.
Defesa do Des. Siro Darlan – E o promotor chegou a comentar o porquê dele entender estranho haver uma liminar deferida em plantão, por que que isso seria rápido, se no plantão as liminares são dadas ou não em um dia só?
Sr. Crystian Guimarães Viana – Não.
Excelência, tem-se aí prova da mais absoluta e
desavergonhada desconsideração com a prerrogativa de foro constitucionalmente assegurada a Desembargador de Tribunal de Justiça!
Não foi Crystian Viana quem inseriu o nome de Siro Darlan
em sua delação, mas sim o próprio promotor do MPRJ sem atribuição que, logo antes, provocara o colaborador a falar sobre fato completamente estranho àqueles apurados na Operação Betrug.
Essa pergunta, sem qualquer relação com os demais fatos,
causou estranhamento ao próprio Crystian, que inclusive indagou ao promotor o porquê daquela indagação sobre o paciente:
Sr. Crystian Guimarães Viana – [00:17:12, PARTE 2] Me recordo também que quando essa questão do juiz… eu ainda perguntei para o promotor se isso era algo do caso, uma vez que na época eu entendi que não né? Porque não era um HC meu, era um HC do Ricardo, então eu tava fazendo uma delação premiada de assuntos específicos da Câmara Municipal, né? Então foi uma pergunta que eu fiz a ele, e ele disse, como Vossa Excelência ainda me falou: “não, você tem que falar a verdade, tudo o que você sabe” e foi narrada toda a verdade.
Observe-se que isso foi logo após a soltura de Crystian, ou
seja, em final de dezembro de 2015 ou início de janeiro de 2016. Muito antes da Lei nº 12.850 exigir a gravação das tratativas e dos atos de colaboração.
Assim, protegidos pela falta de registro das tratativas da
delação premiada de Crystian Viana, os Promotores do MPRJ iniciaram verdadeira investigação, sem atribuição e sem autos, contra o paciente.
Há poucos meses, pareceria um exagero conspiracionista
afirmar que parte dos promotores e procuradores do país, ao saber de decisão favorável a investigado ou acusado, passam a investigar extraoficialmente e subterraneamente o magistrado prolator, seja provocando sua inclusão em delação premiada, seja solicitando à Receita Federal para fazer uma “análise patrimonial” do julgador, por exemplo.
Não mais: hoje, é fato público e notório que alguns dos Procuradores de Curitiba retaliavam e investigavam Desembargadores e Ministros que proferiam decisões desfavoráveis à Lava Jato, mesmo sem possuírem atribuição para tanto.
O testemunho de Crystian no PAD CNJ nº 000692694.2018.2.00.0000 é prova de os Promotores do MPRJ serem entusiastas do mesmo método.
Tais fatos são incontroversos e, inclusive, a própria
autoridade coatora expressamente reconheceu a usurpação de competência na celebração e homologação do acordo de colaboração premiada de Crystian Viana, sem determinar, contudo, as consequências jurídicas que a gravidade da ilegalidade demanda.
Esse é apenas o início da história. Mas, já a partir daqui,
cessou a atribuição dos Promotores de Justiça para atuar no processo de negociação e celebração da colaboração premiada de Crystian Viana, uma vez que, por provocação deles próprios, Desembargador do TJRJ passou a nela figurar como delatado.
Em outras palavras, a partir daqui, em final de dezembro
de 2015 ou início de janeiro de 2016, todos os atos praticados pelos órgãos de investigação o foram em usurpação de atribuição da Procuradoria-GeralDa República com atuação no Superior Tribunal de Justiça, onde o paciente possui foro por prerrogativa de função.
3.2. Crystian Guimarães Viana, colaborador premiado e longa manus dos Promotores de Justiça de Resende-RJ. Investigação subterrânea conduzida por autoridades sem atribuição. Colaboração premiada celebrada em desrespeito à prerrogativa de foro do paciente.
Após essas reuniões iniciais com o MPRJ ainda em janeiro,
nas quais por provocação expressa de Promotor de Justiça o paciente acabou atraído para a colaboração de Crystian Viana, o colaborador premiado, sob orientação dos órgãos de investigação e com equipamentos por eles fornecidos, passou a agendar conversas com os demais investigados para gravá-los, com a finalidade de alimentar o seu acordo então em vias de celebração.
De acordo com Crystian Viana em seu testemunho no PAD, logo depois das primeiras reuniões, “a gente fez algumas ações controladas na gravação”:
Defesa do Des. Siro Darlan – Então se aproximou do promotor, disse que queria [00:28:25, PARTE 2] fazer a colaboração, então, o que aconteceu depois? Sr. Crystian Guimarães Viana – Nós começamos a ter algumas reuniões, aqui no Rio de Janeiro, no MP do Rio. E aí foi tendo uma reunião, depois outra, depois outra, depois eu tive uma outra reunião com a polícia do Ministério Público, eu posso estar falando um termo errado, foi isso aonde a gente fez algumas ações controladas na gravação [00:28:55] de alguns áudios e… foi isso. E aí até hoje inclusive, até na data de hoje, eu sou chamado pelo Doutor Fabiano…
O próprio Ministério Público do Rio de Janeiro, na denúncia
oferecida na Ação Penal nº 0054858-83.2017.8.19.0000 em face de coinvestigados de Crystian Viana e de Ricardo Abbud na Operação Betrug, confirma que atuou junto com o colaborador na produção das gravações[16]:
Por meio dessas gravações, Crystian Guimarães Viana
passou a atuar como longa manus dos Promotores de Justiça de Resende-RJ que já não possuíam atribuição para atuar no feito, produzindo elementos de corroboração para sua colaboração premiada, na qual delatava, além do paciente, vereadores daquele município, os quais a Constituição do Estado do Rio de Janeiro prevê prerrogativa de foro junto ao Tribunal de Justiça.
Ou seja, de modo similar ao que hoje se sabe ter ocorrido
no âmbito da Lava Jato, os promotores responsáveis pela Operação Betrug iniciaram uma espécie de investigação subterrânea – e que só poderia ser subterrânea, pois flagrantemente ilegal – contra, entre outras pessoas, autoridades com prerrogativa de foro, sem a necessária supervisão judicial.
No mesmo sentido, tem-se duas informações prestada por
agente da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Estado de Segurança Pública do Rio de Janeiro – documentos apresentados pelo próprio MPRJ como anexos na AP nº 0054858-83.2017.8.19.0000.
A primeira dessas informações comprova que, por diversas
vezes, equipe de policiais se deslocou para Resende, “com consentimento dos promotores do GAECO/MP” – frise-se, sem atribuição para continuar atuando no processo de colaboração que passara a envolver o paciente –, a fim de “prestar auxílio” e “oferecer suporte técnico e material para as gravações”[17].
É também consignado que os membros do MPRJ eram
atualizados a todo momento sobre a operação de gravação: “Cabe informar que em todos os momentos […] este signatário estabelecia contato telefônico com a Autoridade Policial e Superintendente de contrainteligência […] e este, por sua vez, atualizava os membros do Ministério Público dos trabalhos realizados”.
Resta sublinhado, ainda, o status de colaborador de Crystian Viana, o qual “se encontra em um acordo de delação premiada nos autos de procedimento investigatório instaurado pelo […] GAECO/MP”.
Confira-se a íntegra do documento em questão:
O teor dessa informação deixa claro que Crystian não
gravou seus conterrâneos de forma independente e por iniciativa própria, mas sim que contou com completo suporte e auxílio dos órgãos de investigação.
Por sua vez, a segunda informação, lavrada por outro
agente da Subsecretaria de Inteligência revela que os equipamentos de gravação foram devolvidos por Crystian Viana somente meio ano depois, em 16 de junho de 2016[18]:
(…)
Como se nota acima, de janeiro a junho de 2016 o “colaborador CRYSTIAN GUIMARÃES VIANA, Identidade nº 105769244” utilizou equipamentos da Subsecretaria de Inteligência do Estado para gravar áudios e obter elementos de corroboração para sua colaboração premiada.
Assim agiu “em apoio à investigação desencadeada e
coordenada pelos Promotores do GAECO/MP”, cuja atribuição para atuar no feito já havia cessado desde a inclusão do paciente na delação – por provocação, importante lembrar, dos próprios Promotores de Justiça.
Feita esta importantíssima digressão sobre o contexto em
que produzidas as gravações posteriormente utilizadas para instaurar o INQ 1.199/DF, umbilicalmente ligadas ao processo de negociação e celebração da colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, cumpre prosseguir com a exposição fática.
Em data não precisada, mas já após algumas reuniões no MPRJ e certamente antes do dia 22 de janeiro de 2016, Crystian Guimarães Viana efetuou gravação com homem chamado Sandro, um dos investigados em Resende-RJ.
Nessa conversa, Crystian deixa claro que havia sido
chamado para prestar depoimento novamente no MPRJ no próximo “dia vinte e dois, sexta-feira”:
Ao longo de toda o diálogo, Crystian levanta assuntos e
menciona pessoas de interesse dos investigadores.
Em um dado momento, em uma clara tentativa de fisgar
declaração sobre fato constante em sua colaboração o próprio colaborador tenta provocar manifestação de Sandro sobre o habeas corpus de Ricardo
Abbud[19]:
Crystian Viana provoca o assunto do HC e finge para Sandro saber menos sobre a questão do que sabia, para ver se o interlocutor confirmava a informação que os Promotores sem atribuição do MPRJ queriam em sua investigação sobre a atuação do paciente.
Importante frisar que a transcrição da gravação desse
diálogo, ocorrida antes de 22 de janeiro de 2016, não foi enviada pelo MPRJ ao Superior Tribunal de Justiça. A defesa do paciente só obteve conhecimento dela após o levantamento de sigilo da Ação Penal n. 005485883.2017.8.19.0000.
A falta de remessa da conversa com Sandro ao STJ não
surpreende, afinal o interlocutor, ao invés de confirmar o boato, o desqualifica:
“Bosco está falando um monte de merda”.
No dia 22 de janeiro daquele ano, Crystian comparece
novamente ao MPRJ – repise-se: órgão sem atribuição para atuar no processo de negociação daquela colaboração premiada, que, por provocação dos próprios Promotores, envolvia Desembargador do TJRJ, ora paciente.
É, então, introduzido a pessoa com a qual manterá intenso
contato pelos próximos meses: o Delegado de Polícia Federal (“DPF”) Jaime Cândido Júnior.
Cumpre frisar que a íntegra da troca de mensagens entre Crystian e Jaime é documento de autenticidade incontroversa, juntado pelo próprio MPRJ como anexo na já referida Ação Penal nº 005485883.2017.8.19.0000 sobre a qual a defesa do paciente tomou conhecimento apenas após o recebimento da denúncia, mas antes do julgamento dos embargos de declaração.
O documento foi submetido à autoridade coatora ainda
em dezembro de 2020, mas, mesmo assim, no julgamento dos embargos realizado em março de 2021, a Corte Especial do STJ insistiu em afirmar que as gravações feitas por Crystian Viana eram dissociadas de seu acordo de colaboração.
Como se verá, essa conclusão simplesmente não é
admissível frente aos documentos acostados aos autos da APN 951/DF.
A partir de 22.1.2016, Crystian e Jaime iniciam troca de
mensagens pelo aplicativo WhatsApp, a qual só cessará quase meio ano depois, em 11.7.2016[20]:
Fl. 2-B da Peça nº 13
Já no dia 24 de janeiro de 2016, Jaime Júnior combina com Crystian Viana o fornecimento de equipamento da Subsecretaria de Inteligência do Estado para que realizasse uma gravação:
Fl. 2-B da Peça nº 13
O objetivo era simular, durante depoimento no MPRJ, um “teatro” na frente do próprio advogado do colaborador e de outro investigado que seria ouvido – Ricardo Abbud –, deixando de responder às perguntas, para então, em conversa de corredor, gravá-lo.
Como Ricardo acabou não comparecendo, a gravação
não foi necessária. Ainda assim, Jaime orientou Crystian a manter a encenação (imagem na página seguinte):
Fl. 2-B da Peça nº 13
Como se nota acima, ao final da oitiva encenada, na qual Crystian Viana fingiu para seu próprio advogado não ter ainda iniciado as tratativas do acordo de colaboração e já ter sido ouvido sobre determinados fatos – inclusive aquele envolvendo o ora paciente –, é fornecida a Crystian Viana uma “cópia do depoimento” com as perguntas formuladas pelos promotores, mas não respondidas pelo colaborador na ocasião.
Em outras palavras, uma lista de perguntas com os temas
que constariam em sua colaboração premiada.
Conforme se verá logo adiante, a tática era mostrar a lista
aos demais investigados a fim de que, sem saber estarem sendo gravados, comentassem sobre os temas.
Ainda no dia 25.1.2016, o DPF Jaime Júnior orienta Crystian Viana a manter o seu aparelho celular sempre carregado, de modo que pudesse realizar as gravações mesmo quando procurado de surpresa:
Fl. 3 da Peça nº 13
Pergunta, ainda, se o advogado do colaborador poderia
comparecer “no Gaeco amanhã” para assinar o acordo:
Fl. 4 da Peça nº 13
O diálogo comprova que o acordo de colaboração
premiada de Crystian Viana, o qual continha anexo versando sobre o Desembargador Siro Darlan, estava quase pronto em 25.1.2016.
Já restava clara a usurpação de atribuição para celebrá-
lo, mas somente muitos meses depois é que os Promotores de Justiça do MPRJ sem atribuição decidiram remeter os autos ao Superior Tribunal de Justiça.
Os promotores, por óbvio, não estavam alheios à troca de
mensagens entre Crystian e o DPF Jaime. O trecho abaixo comprova que, paralelamente, o colaborador se comunicava também com os membros do MPRJ, que orientavam quem gravar e o que perguntar:
Fl. 6 da Peça nº 13
Por vezes, as orientações dos Promotores de Justiça eram
repassadas pelo DPF ao colaborador:
Fl. 8 da Peça nº 13
Nítido, portanto, que Crystian Viana, ao gravar seus
conterrâneos de Resende-RJ, não estava agindo por conta própria, e sim atuando como marionete tanto do MPRJ quanto da Polícia Federal no Rio de Janeiro – órgãos, contudo, sem atribuição para atuar no processo de negociação e celebração daquela colaboração premiada que já envolvia o paciente, Desembargador do TJRJ.
A estratégia dos interrogatórios clandestinos conduzidos
pelo MPRJ e pela Polícia Federal através de Crystian fica bastante clara na gravação de diálogo travado entre o colaborador e um investigado chamado Luciano [21].
Pelo que se depreende da transcrição, no início da
conversa Crystian e Luciano entram no banheiro de algum estabelecimento, onde o colaborador mostra o documento fornecido pelo MPRJ:
No final do pretenso “termo de depoimento”, constava
que Crystian optara por permanecer em silêncio, de modo a simular que não estava celebrando acordo de colaboração premiada:
Em determinado momento da conversa, Crystian chama
a atenção de Luciano para algum suposto fato que estava colocado no papel, sobre o qual Bosco estava falando “a mil ventos”, “que Ricardo não falou” e do qual tinha dúvidas:
Luciano, contudo, após afirmar “eu não confio no Bosco”,
não desenvolve o assunto na linha que Crystian aparentemente desejava.
No dia 28 de janeiro de 2016, o colaborador informa a Jaime que um advogado chamado Marcelo queria conversar com ele com
“autorização de Fabiano” – que seria Fabiano G. Cossermelli Oliveira, um dos Promotores de Justiça envolvidos em seu acordo de colaboração premiada:
Fl. 9 da Peça nº 13
Apesar de inicialmente ser refratário à gravação da
conversa, pois Marcelo poderia “ficar fazendo defesa”, o DPF Jaime conversa com os promotores e autoriza Crystian a recebê-lo:
Fl. 10 da Peça nº 13
Foi nesse palco montado pelos Promotores de Justiça do MPRJ, que incentivaram Marcelo a falar com Crystian e depois, em conversa com o DPF Jaime, autorizaram Crystian a receber o advogado, onde restou produzido o primeiro elemento encaminhado muitos meses depois ao STJ para embasar a instauração de investigação contra o paciente.
Sob orientação dos órgãos de investigação, Crystian Viana gravou sua conversa com Marcelo e obteve o primeiro elemento de “corroboração” para as declarações envolvendo o paciente que, respondendo pergunta de promotor, havia feito anteriormente ao MPRJ.
Mais que isso: utilizou equipamento fornecido pelas
autoridades cuja atribuição para atuar no processo de colaboração havia cessado desde as primeiras tratativas, em razão da inclusão do paciente na delação, como se depreende pela seguinte troca de mensagens:
Fl. 11 da Peça nº 13
Além disso, a primeira das informações da Subsecretaria
de Inteligência aqui já referenciadas explicita que a entre os dias 27 a 29 equipe de policiais se encontrava em Resende para fornecer equipamentos e suporte a Crystian Viana[22]:
Pois bem.
Logo no início do diálogo entre Crystian e Marcelo, fica
claro que o próprio Promotor Fabiano havia pedido para o advogado conversar com Crystian Viana[23].
Confira-se:
Ou seja, atuando nas duas pontas, influenciando tanto o
colaborador como a pessoa a ser gravada, o Promotor de Justiça Fabiano garantia a gravação das conversas que interessavam à investigação.
Em determinado ponto da conversa, Marcelo menciona o
boato envolvendo o ora paciente, assunto de interesse do colaborador
(imagem na página seguinte):[24]
Como se nota, Crystian, além de fingir surpresa sobre esse
assunto, o qual já havia declarado ao MPRJ em sede de delação premiada, tenta provocar Marcelo a declinar mais informações sobre o boato (“Quem falou isso, cara?”, “Cinquenta mil?”, “E cê acha que é possível?”).
Marcelo, contudo, responde vagamente (“Tão falando
aí”, “Tão falando aí”, “Tudo é possível”).
A vagueza de Marcelo e o fato de se tratar de conversa
sobre boato, do qual nenhum dos interlocutores possuía conhecimento direto, não impediu Crystian Viana de utilizar o diálogo de 28 de janeiro como elemento de corroboração para sua delação contra o paciente.
Como se verá a seguir, o acordo foi assinado apenas
quatro dias após essa gravação, em 1º.2.2016, já contendo o tema da concessão da liminar do HC de Ricardo Abbud.
Só muito posteriormente, em julho daquele ano, o MPRJ
encaminhou a gravação ao STJ.
Após ouvir a conversa gravada, o DPF Jaime expressou
bastante satisfação com o seu teor:
Fl. 11 da Peça nº 13
Decidiu, então, deixar dois equipamentos da Secretaria de Inteligência com o colaborador indefinidamente, de modo a possibilitar a continuidade das gravações que alimentavam a delação de Crystian (imagem na página seguinte).
Fl. 11 da Peça nº 13
Poucos dias depois, em 29 de janeiro de 2016, o DPF Jaime
convoca Crystian a comparecer no MPRJ na próxima segunda-feira, dia 1 de fevereiro de 2016, “para formalizar o seu acordo”:
Fl. 12 da Peça nº 13
Foi nesse contexto que, em 1 de fevereiro de 2016, às 17h, Crystian Guimarães Viana compareceu na sede do GAECO/RJ e produziu, em conjunto com diversos Promotores de Justiça, entre eles Fabiano, extensíssimo documento intitulado “Termo de Depoimento”.[25]
Um dos tópicos desse “depoimento” de 1.2.2016 versava
sobre suposto crime de corrupção passiva cometido pelo paciente, boato que, após provocação de promotor, Crystian já havia relatado ao MPRJ.
A autenticidade desse documento como registro de uma
declaração oral, cujas características são sobejamente conhecidas por Vossa Excelência, é altamente questionável, uma vez que mais se assemelha a documento pronto, estruturado e articulado, possivelmente fornecido via meio digital aos Promotores de Justiça de 1ª instância pelo advogado do colaborador: são 47 laudas abrangendo diversos temas, expostos de forma estruturada, organizada e com divisão em tópicos.
Basta passar os olhos pelo documento para constatar que
não se trata de um depoimento reduzido a termo, mas sim de texto ao longo de todo um processo de negociação, o qual, segundo o próprio Crystian Viana, iniciou-se logo após sua saída do cárcere em dezembro de 2015.
Conforme já anteriormente exposto pelo colaborador aos Promotores de Justiça de Resende-RJ nas reuniões iniciais lamentavelmente não registradas, mas confirmadas por Crystian em seu testemunho no PAD nº 0006926-94.2018.2.00.0000, constou no documento ter ouvido de Ricardo Abbud que o pai do companheiro de cela, João Bosco, havia “comprado” a decisão liminar proferida pelo Desembargador Siro Darlan em seu favor no plantão de 31.10.2015.
Eis o trecho (imagem na página seguinte):
(…)
Ou seja, já no primeiro dia de fevereiro de 2016 a
colaboração premiada de Crystian Viana passou a contar formalmente com relato de suposto fato criminoso praticado pelo paciente, Desembargador com foro constitucional por prerrogativa perante o STJ.
Obviamente esse acordo não poderia ser negociado com
e celebrado por Promotores de Justiça de 1ª Instância, usurpando atribuição exclusiva da Procuradoria-Geral da República em atuação perante o STJ.
Contudo, como visto e conforme afirmado pelo
colaborador em seu testemunho prestado no PAD, o paciente na verdade já figurava de fato na delação de Crystian Viana desde o final de dezembro ou início de janeiro, quando inquirido acerca do paciente por promotor e, após, repetidas vezes, por orientação e com o auxílio dos órgãos de investigação, inclusive utilizando equipamentos por eles fornecidos, gravou seus conterrâneos visando angariar elementos de corroboração.
Mas a investigação conduzida subterraneamente pelos Promotores MPRJ através de Crystian não parou com a celebração do acordo o qual não possuíam atribuição para celebrar.
Como se depreende pelos seguintes trechos da conversa
entre Crystian e o DPF Jaime Júnior, nos meses subsequentes o colaborador continuou efetuando as gravações sob orientação dos investigadores, com a finalidade de angariar mais elementos de corroboração e assim obter uma redução de pena ainda maior, ou até mesmo o “perdão [judicial]”:
Fl. 13 da Peça nº 13
Fl. 16 da Peça nº 13
Percebe-se que Jaime incentiva o colaborador a
continuar produzindo dados de corroboração, afirmando existir a “possibilidade” do perdão judicial caso o colaborador “[siga] com o que está fazendo”.
Inclusive, em abril de 2016, o DPF Jaime Júnior confirma
para Crystian Viana que as gravações integravam a sua colaboração e que o colaborador deveria depor “para confirmar que foi vc quem [as] fez”:
Fl. 23 da Peça nº 13
Só esqueceram de solicitar a Crystian que ele informasse
ter feito as gravações com equipamentos fornecidos pelo próprio Delegado Jaime, e com perguntas orientadas por Promotores de Justiça cuja atribuição para atuar no procedimento de colaboração havia cessado pelo menos desde o início janeiro de 2016!
Este o contexto em que produzidas as gravações
posteriormente utilizadas como base material exclusiva para instaurar o INQ 1.199/DF contra o paciente, ligadas umbilicalmente ao acordo de colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, conduzido e celebrado sem o menor respeito à prerrogativa de foro dos vereadores e do Desembargador investigado.
3.3. Decisão do STJ que reconheceu a usurpação de competência praticada em violação à prerrogativa de foro dos vereadores de
Resende-RJ
Em 17 de fevereiro de 2016, os Promotores de Justiça do GAECO/RJ tentaram homologar o acordo celebrado com Crystian Viana junto ao Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Resende/RJ.
Eis o cabeçalho da petição[26] (imagem na p. seguinte):
O pedido foi instruído com o acordo de colaboração
premiada propriamente dito e com o supracitado termo de depoimento do colaborador datado de 1º de fevereiro.
Evidentemente, constando nos relatos do colaborador
acusação contra desembargador de Tribunal de Justiça estadual, o Juízo Competente para homologar a colaboração era o STJ, e não o Juízo da 2ª Vara Criminal de da Comarca de Resende/RJ.
Ainda que Siro Darlan não figurasse como delatado, a
competência seria do TJRJ, uma vez que a delação abrangia supostos crimes praticados pelos vereadores da cidade.
Nota-se, assim, que o desrespeito às prerrogativas de foro
dos investigados era o modus operandi dos Promotores de Resende-RJ.
Somente quando a 6ª Turma Criminal do STJ, em
26.04.2016, concedeu ordem de habeas corpus a Ricardo Abbud no RHC 68.718/RJ, reconhecendo a usurpação da atribuição do Procurador Geral de
Justiça e da competência do TJRJ, o MPRJ encaminhou o procedimento aoTribunal Fluminense, cabendo ao desembargador José Muiños Piñeiro Filho arelatoria da matéria no âmbito do TJRJ.
Eis o trecho relevante da decisão, que inequivocamente
reconhece um padrão de ilegalidade que estava em curso nas investigações conduzidas pelo GAECO/MPRJ a partir da colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, qual seja, investigação por promotores sem atribuição e com usurpação de competência, o que também se verifica no caso do paciente:
“1. Cabe ao Tribunal, e não ao Juízo de primeiro grau ou ao órgão da acusação, a palavra final a respeito do desmembramento da ação penal, em decorrência da existência de corréu com prerrogativa de foro. Doutrina e precedente do Supremo Tribunal Federal.
2. No caso, mostra-se flagrante a ilegalidade decorrente do desmembramento da ação penal em relação aos corréus que não possuem prerrogativa de foro pelo próprio órgão da acusação.”
(STJ, Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº. 68.718/RJ.
Min. Rel. Sebastião Reis Júnior.
Decisão da 6ª Turma de provimento ao recurso. Recorrente: Ricardo Abbud de Azevedo. Recorrido: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro. Data do julgamento: 26.4.2016.)
A decisão do STJ provocou extrema preocupação em Crystian Viana, sendo então tranquilizado pelo DPF Jaime Júnior:
Fls. 23 da Peça nº13
Fl. 24 da Peça nº 13
Mas nem mesmo a referida decisão do STJ fez cessar a
investigação subterrânea conduzida pelos Promotores de Justiça do MPRJ e pelo DPF Jaime Júnior através do colaborador, que, ao contrário, continuou a todo vapor.
3.4. Gravação da advogada Nathalie Anselmo e o Termo de
Colaboração nº 10.
Em junho de 2016, Crystian Viana havia combinado com
sua então advogada, a Dra. Nathalie Anselmo, de comparecer à sede do MPRJ no Rio de Janeiro no dia 16 próximo.
Após avisar Jaime Júnior sobre sua ida à capital, Crystian
é orientado pelo Delegado a gravar a conversa com sua defensora no carro:
Fl. 29 da Peça nº 13
A orientação é seguida à risca pelo colaborador, que,
orgulhoso do feito, afirma ao Delegado: “A gravação ficou boa vc vai gostar” (imagem na página seguinte).
Fl. 31 da Peça nº 13
Essa gravação de 16 de junho de 2016 foi o segundo
elemento produzido através de Crystian pelo MPRJ e pela Polícia Federal que restou posteriormente enviado ao STJ, servindo como base para instaurar o INQ 1.199/DF contra o Desembargador Siro Darlan.
Com o flagrante e óbvio propósito de produzir ainda mais
elementos para corroborar a sua colaboração premiada, visando assim lograr êxito em obter maiores benefícios ou até mesmo o perdão judicial, o próprio colaborador indaga Nathalie Anselmo sobre o boato envolvendo o ora
paciente31.
Provocada por Crystian, a advogada, então, descreve
como teria “ouvido dizer” sobre a suposta venda de decisão liminar:
Nathalie já havia conversado anteriormente com Crystian
sobre o boato (“ele contou isso pra mim e eu que contei isso pra você”). Por óbvio, a real intenção de Crystian não era saber se Nathalie tinha conhecimento do boato, pois o colaborador já sabia disso.
Pretendia, na verdade, uma vez mais registrar afirmação
de terceiro sobre o suposto fato, de modo a corroborar a sua delação.
Depois de ouvir a gravação da conversa de Crystian com
a advogada, produzida por orientação sua, o Delegado Jaime Júnior tentou, com urgência, entrar em contato com o colaborador:
Fl. 31 da Peça nº 13
Em seguida, uma série de mensagens é trocada entre o
policial e Crystian Viana. Como parte delas foi enviada em áudio, não é possível apreender inteiramente o que se passou no dia 17 de junho de 2016 por meio do documento apresentado pelo MPRJ nos autos da AP nº 005485883.2017.8.19.0000 e juntado pela defesa do paciente na APN 951/DF assim que dele tomou conhecimento.
Pode-se, contudo, identificar que, após a gravação da
conversa com a advogada Nathalie, os Promotores de Justiça do MPRJ sem atribuição e o DPF Jaime viram a necessidade de refazer o termo de depoimento assinado pelo colaborador em 1.2.2016, com extrema urgência.
Se necessário fosse, o Delegado orientou Crystian a
inclusive contratar outro advogado para participar do ato!
Os diálogos daquele demonstram que, como o próprio Crystian Viana coloca, seu advogado atuante no processo de negociação e celebração de sua colaboração premiada era apenas “pra fazer figuração”. Tratava-se apenas de figura necessária por exigência legal, mas que, naquele procedimento, não estava exercendo a sua relevante função de fiscalizar, no particular, a observância dos direitos do colaborador e, no geral, a própria legalidade dos atos praticados.
Tão indesejada a presença de um advogado de fato que,
após Crystian sugerir a participação de um Defensor Público, o DPF Jaime responde “eu acho que não, pois ele iria querer ver todo o processo” (imagem na página seguinte):
Fl. 32 da Peça nº 13
A verdade é que, conforme admitido pelo colaborador
quando ouvido no PAD CNJ, os próprios Promotores de Justiça do MPRJ sem atribuição para atuar na colaboração é quem escolhiam seu advogado:
Sr. Juiz Federal – [00:11:12, PARTE 1] Então o senhor não sabe o nome de seu advogado…
Sr. Crystian Viana – Posso procurar no meu celular.
Sr. Juiz Federal – … e nem o nome do anterior advogado? O senhor falou que… então tem dois, teve um na época da colaboração… o nome dele seria Ricardo Jorge da
Silva Junior?
Sr. Crystian Viana – Sim, seria.
Sr. Juiz Federal – É? Tá. Então ele ficou só na época da delação. E o anterior a esse, quem é?
Sr. Crystian Viana – Esse foi somente o que entrou com um HC comigo, e esse era… a gente teve que sair, que ele era de Barra do Piraí, eu não vou me recordar o nome dele., Mas esse a gente teve um problema, que foi uma suposta… que quem taria pagando a eles eram os vereadores de Resende, e aí a Promotoria inclusive me solicitou… me aconselhou a trocar de advogado.[27]
Por certo, a falta de defensor atuando na colaboração,
mas apenas de advogado figurante escolhido pelos promotores, foi um dos fatores que permitiu a proliferação de ilegalidades naquele acordo, em especial da usurpação de atribuição que já perdurava desde dezembro de 2015 ou início de janeiro de 2016, a partir da inclusão do paciente na delação.
Assim que na terça-feira, dia 21 de junho de 2016, foi
confeccionado o documento denominado “Termo de Colaboração nº 10”, com conteúdo idêntico ao documento de fevereiro, só que contando apenas com o suposto fato envolvendo o paciente[28]:
(…)
Este o terceiro e último elemento produzido pelo MPRJ no
âmbito da colaboração premiada de Crystian Viana que serviu de base para, posteriormente, instaurar o INQ 1.199/DF.
Embora simule se tratar de um novo depoimento de Crystian Guimarães Viana prestado em 21.6.2016, chama atenção o fato de o Termo de Colaboração nº 10 conter as exatas mesmas palavras do primeiro suposto depoimento, de 47 laudas, colhido em 1.2.2016.
Obviamente, não foi tomado depoimento algum naquele
dia. Crystian compareceu às 19h no MPRJ em Volta Redonda apenas para assinar o novo documento e os demais termos de colaboração.
O efeito prático dessa reestruturação da colaboração
premiada de Crystian foi conferir recentidade inexistente às declarações do colaborador, formalizadas não em 21.6.2016, mas na realidade muito antes, em 1.2.2016.
Medida tomada, muito provavelmente, em razão da
decisão do STJ que havia reconhecido a usurpação de competência em relação aos vereadores. Seria, então, uma forma de tentar “preservar” a legalidade da investigação, a qual, entretanto, já estava há muito viciada.
Ficou parecendo, portanto, que a violação à prerrogativa
de foro do paciente junto ao STJ somente ocorreu a partir de junho de 2016, quando, em verdade, já vinha ocorrendo desde dezembro de 2015/janeiro de 2016, quando, durante as tratativas iniciais do acordo, Promotor de Justiça provocou Crystian Viana a incluir o paciente em sua delação.
3.5. Encaminhamento tardio e seletivo de documentos ao STJ, de modo a mascarar a inobservância da prerrogativa de foro do paciente e o fato de as gravações terem sido produzidas com auxílio do MPRJ.
No dia 11 de julho de 2016, o MPRJ encaminhou ao Superior Tribunal de Justiça o material que indicaria a prática de crime pelo
paciente[29].
Contudo, ao invés de remeter toda a colaboração
premiada, todas as conversas entre Crystian e o DPF Jaime e todas as gravações feitas pelo colaborador para alimentar sua delação, foram remetidos apenas e tão somente os seguintes elementos:
- Termo de Colaboração nº 10 de Crystian, o colaborador de “ouvir dizer”: não sabia do fato, mas
ouviu de um terceiro que tampouco podia dele ter conhecimento direto, pois, à época, estava preso.
- Gravação de Marcelo, que também “ouviu dizer” sobre o boato de fonte indeterminada, efetuada com equipamentos fornecidos pela Subsecretaria de Inteligência do Estado e com autorização dos Promotores do Justiça.
- Gravação de Nathalie Anselmo, a própria advogada do colaborador, que afirma ter “ouvido dizer” de Bosco sobre a suposta venda de decisão em plantão, gravada por orientação do Delegado Jaime, que atuava juntamente com os Promotores de Justiça do MPRJ.
As duas gravações, conforme visto, não foram produzidas
de forma independente à delação premiada de Crystian Viana.
Muito pelo contrário: foram efetuadas justamente no bojo
do processo de negociação e celebração do acordo de colaboração, como forma de robustecê-lo e assim melhorar os benefícios conferidos ao colaborador, e contaram com todo o suporte e participação do MPRJ e de Delegado de Polícia Federal, que não apenas orientaram Crystian Viana sobre quem gravar e o que gravar, como também forneceram equipamentos da Subsecretaria de Inteligência do Estado para que o delator pudesse realizar as gravações.
Além disso, a estratégia de se encaminhar somente o
segundo depoimento à PGR acabou conferindo às declarações do colaborador recentidade inexistente, como se a usurpação de atribuição tivesse ocorrido somente após 21 de junho de 2016, e não seis meses antes, nos primórdios das tratativas do acordo de Crystian.
Logo após, no dia 13 de julho de 2016, consumou-se a
usurpação de competência do Superior Tribunal de Justiça.
Por meio de decisão manuscrita, oDesembargador José Muiños Piñeiro Filho, do TJRJ, homologou o acordo de colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, com todos seus anexos, incluindo o Termo de Colaboração nº 10[30].
Ou seja, a colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, com anexo que tratava especificamente de crime em tese praticado por Desembargador do TJRJ, foi homologada por juízo absolutamente incompetente para fazê-lo, após procedimento conduzido por Promotores de Justiça sem atribuição.
3.6. Inquérito instaurado com base exclusivamente nos elementos obtidos na negociação de colaboração premiada celebrada como promotores sem atribuição e homologada por autoridade incompetente.
Somente em 4 de julho de 2017, quase um ano após a
homologação do acordo de colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, o Vice-Procurador Geral da República José Bonifácio requereu a instauração de inquérito para investigar o suposto crime cometido pelo paciente.
Basta a leitura do requerimento de instauração para se
verificar, de plano, que o pedido teve como base apenas e tão somente atos da colaboração premiada de Crystian Viana: o Termo de Colaboração nº 10 (2º depoimento do colaborador, de 21.6.2016), assinado por Promotores de Justiça de 1ª instância, e as gravações efetuadas pelo colaborador no âmbito de sua delação36.
Leia-se:
(…)
- 3 – Requerimento de instauração do INQ 1.199/DF.
(…)
Em 21.8.2017, acolhendo o pedido do Parquet, o Ministro Luis Felipe Salomão determinou a autuação do Inquérito 1.199/DF37 tendo como base material exclusiva o Termo de Colaboração nº 10 e as gravações produzidas no âmbito da colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, sob orientação dos Promotores de Justiça do MPRJ sem atribuição e do DPF Jaime Júnior, inclusive com utilização de equipamento fornecido pelos órgãos públicos.
- 4 – Decisão determinando autuação do INQ 1.199/DF.
Só então o Desembargador Siro Darlan passou a ser
formalmente investigado em procedimento criminal, muito embora, como visto acima, já estivesse sendo alvo de investigações por Promotores de Justiça, no âmbito de colaboração premiada homologada pelo TJRJ, há pelo menos um ano e meio.
3.7. Da continuidade do INQ 1.199/DF apesar da defesa do paciente, já em 2019, apontar o evidente vício na sua origem.
Após sua instauração, o INQ 1.199/DF prosseguiu
lentamente por mais de um ano38, até que, em 14.1.2019, o Parquet requereu a quebra do sigilo de dados telefônicos do paciente e outros investigados.
O relator deferiu a medida, citando como solitária
fundamentação os “relatos iniciais obtidos em colaboração premiada”39:
A partir daí, o praticamente inerte INQ 1.199/DF acelerou
desenfreadamente, atropelando sem a menor cerimônia quase todos os
- Nesse ínterim, houve apenas decisão determinando quebra de sigilo de dados bancários em desfavor de Ricardo Abbud e de seus familiares, mas não do paciente (Peça nº 25). O resultado dessa quebra, contudo, não foi utilizado para fundamentar a decisão posterior, essa sim tendo o paciente como alvo direto.
- 6 – Decisão decretando a quebra do sigilo de dados telefônico do paciente.
direitos constitucionais do paciente passíveis de serem atingidos em um inquérito penal.
Em setembro de 2019, foi realizada busca e apreensão
tanto no gabinete quanto na residência do paciente[31]. Somente a partir daí é que tomou conhecimento da investigação que tramitava contra si no Superior Tribunal de Justiça.
Após sua defesa obter vista dos autos, foi rapidamente
verificado que o sustentáculo da investigação se tratava de colaboração premiada conduzida sem o menor respeito à prerrogativa de foro do paciente.
Ato contínuo, a defesa do Desembargador Siro Darlan de Oliveira apresentou, nos autos do INQ 1.199/DF, mídia contendo a gravação do testemunho de Crystian Guimarães Viana no PAD CNJ nº 000692694.2018.2.00.0000, bem como petição, datada de 17 de outubro de 2019, destacando os trechos do depoimento do colaborador em que admite ter sido provocado por Promotor de Justiça a incluir Siro Darlan em sua delação[32].
Nenhuma providência foi tomada a partir da petição.
Passados vários meses, em 3 de abril de 2020, foi
determinada uma segunda rodada de busca e apreensãona residência e no gabinete do paciente[33].
Além de busca e apreensão, a decisão do dia 3.4.2020
também determinou: (i)o afastamento do sigilo fiscal e bancário por um período de quase cinco anos, (ii) afastamento cautelar do exercício do cargo (iii) proibição de contato com assessores e servidores do TJRJ, (iv) proibição de contato com os demais investigados e (v) bloqueio de bens até o limite de um milhão de reais.
Ou seja, praticamente todas as medidas possíveis, à
exceção da prisão cautelar!
Concomitante ao pedido por uma nova fase de busca e
apreensão, o Ministério Público Federal ofereceu a denúncia em desfavor do Desembargador Siro Darlan de Oliveira, assim iniciando a APN 951/DF.
Em maio de 2020, a defesa de Siro Darlan apresentou nova
petição, expondo minuciosamente a cronologia fática até então conhecida (não se sabia do Termo de Depoimento datado de 1.2.2016, tampouco das conversas mantidas entre Crystian e o DPF Jaime)
A nova petição43, assim como a primeira, igualmente não
foi apreciada.
Então, em julgamento realizado no dia 16 de setembro de 2020, foi proferido o primeiro dos atos coatores, qual seja, a decisão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça recebendo a denúncia oferecida pelo MPF nos autos da APN 951/DF.
Tem-se, assim, a seguinte cronologia:
•Acórdão do TJRJ revogando a prisão preventiva de Crystian Guimarães Viana.
17.12.2015
•Crytian Guimarães Viana procura o MPRJ e inicia as tratativas de seu acordo de colaboração premiada. Por
Entre provocação de Promotor de Justiça sem atribuição para investigar o paciente, o Desembargador Siro 12.2015 Darlan é incluído na delação de Crystian. Cessa aqui a atribuição dos promotores do MPRJ para atuar no e 1.2016 processo de negociação e celebração do acordo de colaboração premiada de Crystian Viana.
•Crystian Guimarães Viana, em conversa gravada com investigado da Operação Betrug chamado Sandro, Antes de indaga sobre fato envolvendo o paciente. Sandro não dá continuidade ao assunto.
22.1.2016
•O Delegado de Polícia Federal Jaime Júnior inicia suas conversas com Crystian Guimarães Viana por meio do aplicativo de mensagens WhatsApp. O DPF e os Promotores de Justiça orientam o colaborador a
22.1.2016 realizar gravações, inclusive com equipamentos oficiais, de modo a corroborar sua delação. •Com equipamentos fornecidos pelas autoridades e sob orientação e auxílio dos Promotores de Justiça do
28.1.2016 MPRJ sem atribuição e do DPF Jaime Júnior, Crystian Guimarães Viana grava o advogado Marcelo Macedo.
•Crystian Guimarães Viana e os Promotores de Justiça de Resende-RJ assinam documento que simula se tratar de depoimento iniciado às 17h e reduzido a termo em 47 páginas, contendo, entre outros, relato 1º.2.2016 sobre suposto fato criminoso envolvendo o paciente, Desembargador do TJRJ.
•Por orientação das autoridades sem atribuição, Crystian Viana grava sua própria advogada Nathalie
16.6.2016 Anselmo.
•É lavrado o documento denominado Termo de Colaboração nº 10, simulando falso depoimento que teria
21.6.2016 sido prestado por Crystian naquela data, com teor idêntico ao documento de 1º.2.2016.
•O Termo de Colaboração nº 10 e as gravações das conversas entre Crystian Viana e os advogados Marcelo
11.7.2016 Macedo e Nathalie Anselmo são remetidos à PGR com atuação no STJ.
•O acordo celebrado entre Crystian Viana e os promotores sem atribuição, versando sobre fato envolvendo
13.7.2016 o paciente, é homologado por Desembargador do TJRJ, autoridade incompetente.
•Autuado o INQ 1.199/DF com base material exclusiva nos elementos ilegalmente produzidos.
21.8.2017
4. DO CONSTRANGIMENTO ILEGAL
Passada a exposição esmiuçada dos elementos fáticos
que demonstram a umbilical correlação entre as gravações ambientais efetuadas pelo colaborador Crystian Viana e o procedimento de negociação de seu acordo de colaboração com promotores de justiça de primeiro grau atuantes em Resende/RJ, cumpre delinear o constrangimento ilegal sofrido pelo paciente.
A presente ordem visa combater coação ilegal
consubstanciada no recebimento de denúncia e na decretação de medidas cautelares contra o paciente, determinadas pelo Superior Tribunal de Justiça com base em elementos obtidos no bojo de colaboração premiada ilegalmente celebrada em violação às normas constitucionais de determinação de competência.
Conforme demonstrado à exaustão, não se sustenta a
premissa adotada pela autoridade coatora no sentido de que a investigação originária teria sido instaurada e desenvolvida com base em material autônomo e divorciado da ilegal colaboração premiada de Crystian Vianna.
Este foi o enunciado exaustivamente utilizado por aquele
colegiado nos julgamentos em que se decidiu pelo recebimento da exordial, não obstante terem sido expostos em sede de defesa prévia[34] os elementos que atrelam intimamente as gravações ambientais de Crystian Vianna ao
contexto das negociações de seu acordo de colaboração, cuja ilegalidade foi expressamente reconhecida.
Veja-se os trechos do voto condutor, lavrado pelo E. Ministro Luis Felipe Salomão, referente ao primeiro julgamento sobre o recebimento da denúncia oferecida contra o paciente[35]:
1. O Ministério Público Federal ofertou denúncia contra Siro Darlan de Oliveira, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Luis Eduardo Soares e Ricardo Abbud de Azevedo, imputando aos dois primeiros a prática do delito de corrupção passiva – previsto no art. 317, caput, e § 1°, c/c arts. 29, caput, e 30 do Código Penal – e, ao terceiro, a prática do crime de corrupção ativa, tipificado no art. 333, caput, e parágrafo único, do diploma Penal.
Em síntese, a denúncia de fls. 505-574 aponta que o Desembargador Siro Darlan de Oliveira obteve vantagem indevida, em data aproximada de 1º.11.2015, decorrente da venda de decisão liminar proferida no habeas corpus n. 0441519-57.2015.19.0001, durante plantão judicial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro realizado em 31.10.2015, beneficiando o acusado Ricardo Abbud de Azevedo em troca do pagamento de R$ 50.000,00 em propina.
Os fatos narrados decorrem das investigações realizadas no âmbito do Inquérito n. 1.199/DF, deflagrado com base nas Notícias de fato n. 1.00.000.0011346/2016-53 e
1.00.000.017420/2016-45, em que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro reportou o possível envolvimento do Desembargador Siro Darlan em ilícito (e-STJ, fls.73-75 do Apenso n.1).
(…) o acordo foi apresentado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, sendo submetido a homologação no Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Resende-RJ. Todavia, em 13.7.2016, o acordo foi homologado pelo Desembargador José Muñoz Piñeiro
Filho, designado relator no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, devido ao envolvimento, na organização criminosa investigada na origem, de vereadores detentores de foro por prerrogativa de função naquela Corte estadual.
Desse modo, observo que a homologação daquele negócio jurídico foi realizada por juízo incompetente, eis que a citação de autoridade com prerrogativa de foro nesta Corte, ainda que por fato delituoso diverso e não relacionado diretamente com os fatos investigados na origem, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, atrai a competência do Superior Tribunal de Justiça para avaliar a regularidade, legalidade e voluntariedade da avença em sua integralidade.
(…) Com efeito, a homologação do acordo ocorreu em 13.7.2016. Antes, porém, em 11.7.2016, por meio do Ofício
GAB/SUB-ASJUR n. 2.217/2016, subscrito pelo
Subprocurador-Geral de Justiça de Assuntos Institucionais e Judiciais, o fato objeto da investigação deflagrada nessa instância já havia sido comunicado à Procuradoria-Geral da República (e-STJ fl. 330 do Apenso 1).
A notícia-crime veio embasada em gravações ambientais realizadas por Crystian Guimarães Viana. A primeira, registrada em 28.1.2016, trata de conversa mantida com o advogado Marcelo Macedo. No diálogo, percebe-se que é o seu interlocutor (Marcelo Macedo), e não o colaborador, quem menciona o episódio envolvendo a autoridade com prerrogativa de foro, precisamente a negociação do habeas corpus concedido em favor de Ricardo Abbud (e-STJ, fls. 280-310 do Apenso n. 1).
Além desse registro, em 16.6.2016, foi realizada uma segunda gravação ambiental de conversa mantida com Nathalie Anselmo da Silva, em que esta afirma saber da negociação feita para favorecer Ricardo Abbud de Azevedo, acrescentando que a decisão do habeas corpus foi negociada pelo pai do paciente, João Bosco de Azevedo, que já é falecido, de acordo com a narrativa Ministerial (e-STJ, fls. 311-328 do Apenso n.1).
Portanto, está bastante claro que, por meio da notíciacrime encaminhada pelo MPRJ ao MPF – com esteio nas gravações ambientais -, o fato veio ao conhecimento da Procuradoria-Geral da República em momento anterior à homologação do acordo de colaboração premiada celebrado entre Crystian Guimarães Viana e o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.
Convém frisar que as gravações realizadas por Crystian Guimarães Viana são anteriores à homologação do acordo por ele firmado com o Ministério Público Federal, sendo a citação ao Desembargador derivação da serendipidade de indícios sobre a prática de crime que em nada se relaciona com o objeto precípuo da investigação encetada no primeiro grau e direcionada para a elucidação de organização criminosa instalada no âmbito da Câmara Municipal de Resende-RJ, como bem destacaram as defesas dos denunciados. Disso resultou a remessa da notícia-crime à autoridade com atribuição para dar início à investigação contra Siro Darlan de
Oliveira.
Ademais, somente em 5.10.2016 houve o envio do Termo de depoimento n. 10 pelo MPRJ à PGR, sendo considerada de pouca utilidade, tendo em vista que o MPF, àquela altura, já estava em posse da notícia-crime encaminhada à Procuradoria-Geral da República em 11.7.2016. Na sequência, o expediente contendo a notícia-crime embasada nas gravações ambientais foi protocolado nesta Corte, com registro e autuação do feito como Sindicância n. 644/DF em 5.7.2017, sobrevindo a determinação de instauração do inquérito em 21.8.2017. Portanto, o que se considerou relevante para a instauração do procedimento investigatório contra o magistrado nesta Corte não foi a colaboração premiada – e nem poderia ser, tendo em vista que a colaboração é meio de obtenção de prova e não prova em si mesma –, mas os elementos informativos da Notícia de Fato de Instância
Diversa n. 1.00.000.011346/2016-53 (Procedimento MPRJ n.
2016.00679107) relatando o envolvimento do
Desembargador Siro Darlan em prática delituosa, fato esse comunicado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro em declínio de atribuição à Procuradoria-Geral da República em 11.7.2016.
Na ementa do acórdão, a questão restou consignada nos
seguintes termos:
- As duas gravações que embasam a notícia do crime são lícitas, tendo em vista que foram realizadas por um dos interlocutores da conversa, resultando do teor do diálogo um simples conhecimento fortuito da notícia da prática de ilícito envolvendo a autoridade com prerrogativa de foro. A validade das gravações, por si só, é apta para demonstrar a plena regularidade da investigação deflagrada contra o magistrado.
- Esses registros de diálogos são elementos independentes de informação que não se confundem com o acordo de colaboração premiada, tampouco com o termo de depoimento do colaborador.
Verifica-se que a essência do raciocínio operado no
provimento consiste na cisão absoluta entre a) as gravações ambientais realizadas por Crystian e b) todo o processo de negociação e celebração do acordo com Promotores de Justiça sem atribuição e homologação por autoridade incompetente.
A unidade desses expedientes, contudo, se torna
insuperável diante das mensagens esmiuçadas no tópico anterior.
Além disso, invocando precedente com situação fática
absolutamente distinta à do presente caso, consignou que os efeitos de eventual ilegalidade na celebração do acordo de colaboração premiada ensejariam apenas sua ineficácia em relação às partes daquele negócio jurídico (colaborador e órgão da acusação), reputando implicitamente como razoável cercear ao delatado o direito de impugnação de atos persecutórios agressivos à sua esfera jurídica:
Convém ressaltar que, segundo o entendimento firmado pelo STF no HC n. 127.483/PR, “o acordo de colaboração, como negócio jurídico personalíssimo, não vincula o delatado e não atinge diretamente sua esfera jurídica: res inter alios acta.” (HC n. 127.483, rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 27.8.2015, DJe-021 de 4.2.2016). Nessa perspectiva, sendo a homologação simples fator de atribuição de eficácia ao acordo de colaboração, a infringência de regra de competência na homologação da avença resulta em ineficácia da colaboração premiada, porém repercutindo de modo estrito na esfera jurídica do colaborador, diante de sua natureza de negócio jurídico personalíssimo.
Nessa esteira, conquanto tenha havido a homologação da colaboração premiada por juízo diverso, a única consequência é sua eventual ineficácia em relação às partes daquele negócio jurídico.
Ademais, a autoridade coatora indevidamente afastou a
aplicação do precedente firmado pela Colenda Segunda Turma deste Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus 151.605/PR, impetrado em favor do ex-Governador do Paraná Carlos Alberto Richa, segundo o qual vícios relativos à prerrogativa de foro, por afrontarem a própria Constituição Federal, implicam a ineficácia de todos os atos e elementos produzidos na colaboração premiada em relação ao delatado com foro por prerrogativa de função.
O descabido distinguishing residiria na questionável
afirmação de que “nenhum ato de persecução penal foi praticado no primeiro grau de jurisdição contra o detentor da prerrogativa de foro ora denunciado”, assertiva que, conforme observado, não condiz com a realidade, na medida em que (i) a primeira menção ao paciente teria se dado por provocação dos próprios promotores em entrevista com o à época pretenso colaborador; (ii) as gravações ambientais realizadas por Crystian foram coordenadas também pelos mesmos promotores de justiça e com Delegado de Polícia Federal, que forneceram equipamentos para suas realizações.
Recebida a denúncia pelo colegiado a quo, foram
opostos embargos declaratórios[36] na tentativa de sanar omissões de elementos sensíveis não considerados naquele provimento, notadamente o termo de depoimento do colaborador premiado Crystian Viana colhido em 1º de fevereiro de 2016, com teor idêntico àquele colhido em junho daquele ano posteriormente remetido ao Superior Tribunal de Justiça em julho, comprovando que meses antes de remeter o depoimento de Crystian ao Superior Tribunal de Justiça, o Ministério Público do Rio de Janeiro já havia iniciado e conduzido subterraneamente investigação para apurar suposta venda de decisão pelo Des. Siro Darlan, ignorando sua prerrogativa de foro.
Justamente no contexto dessa investigação subterrânea
que Crystian gravou os diálogos com Marcelo Macedo e Natalie Anselmo utilizados para instaurar o INQ 1.199/DF, agindo como longa manus do MPRJ para atingir pessoa fora do alcance do órgão estadual.
Em seu parecer, mais especificamente nos itens 51 e 52, o MPF opinou pela rejeição dos embargos declaratórios, sob o fundamento de que o MPRJ não havia participado na produção das gravações feitas por Crystian Viana[37]:
51. A questão já foi retratada à exaustão no tópico 3.1 do voto do relator. De antemão, assinale-se que não houve participação do Ministério Público na produção de prova pelo colaborador.
52.Não se pode repreender que o próprio colaborador, buscando corroborar os fatos criminosos trazido a lume no seu depoimento, reforce o material probatório com novas evidências que conseguiu angariar. Especialmente neste caso, pois a imputação de corrupção passiva ao embargante, enquanto magistrado de segundo grau, é gravíssima, e havia, sobre ele, o risco de ser-lhe posteriormente imputada a conduta prevista no art. 19 da Lei 12.850/13.
Essa afirmação, no entanto, não poderia estar mais
distante da realidade fática.
No último dia 10 de dezembro, meses antes sequer da
inclusão dos embargos em pauta para julgamento, a defesa do paciente acostou material até então desconhecido aos autos da APN 951/DF[38], extraído da Ação Penal nº 0054858-83.2017.8.19.0000, além do depoimento prestado pelo colaborador no Processo Administrativo Disciplinar movido contra o paciente pelos mesmos fatos da ação originária, este já anteriormente juntado no INQ. 1199/DF no ano de 2019:
Conforme exaustivamente delineado no tópico anterior,
as trocas de mensagens ali acostadas fulminam completamente a conclusão da autoridade coatora, demonstrando que a produção das gravações ambientais por Crystian Vianna ocorreu sob orientação das autoridades sem atribuição persecutória e com equipamentos por elas fornecidos.
No dia seguinte, em 11 de dezembro de 2020, a Seção de Protocolo do STJ efetuou o upload dos arquivos em .pdf contidos no pen drive para os autos eletrônicos da APN 951/DF[39]:
Não obstante o amplo acesso ao referido material, em
julgamento virtual iniciado quase três meses após a sua juntada, em 3 de março de 2021,a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça negou provimento aos embargos opostos pela defesa do paciente, mantendo-se as equivocadas premissas invocadas no primeiro provimento:
De fato, o acórdão embargado reconheceu que o acordo de colaboração premiada, diante da menção ao Desembargador Siro Darlan em um dos termos de depoimento do colaborador Crystian Guimarães Viana (Anexo n. 10), deveria ter sido homologado pelo Superior Tribunal de Justiça, em atenção à prerrogativa de foro da autoridade citada.
Todavia, disso não resultou a nulidade de provas por derivação e a expurgação de elementos informativos dos autos desta ação penal e do inquérito subjacente. Isso porque, a inobservância da regra de competência quanto à homologação do acordo enseja, estritamente, a sua ineficácia em relação às partes daquele negócio jurídico (colaborador e órgão da acusação), o que pode vir a ser avaliado por ocasião da sindicabilidade dos termos da avença na prolação da sentença na ação penal movida contra o colaborador no primeiro grau de jurisdição. Além disso, o acórdão assentou que a investigação encetada no Inquérito n. 1.199/DF não decorreu dos atos de colaboração de Crystian Viana, embora para esta Corte tenha sido enviado o Termo de depoimento n. 10, no qual são mencionadas circunstâncias sobre a negociação e venda da liminar no habeas corpus deferida em favor do réu Ricardo Abbud de Azevedo. Desse modo, não houve omissão no enfrentamento da preliminar, mas uma clara e muito óbvia rejeição da tese de nulidade, porquanto não foi a investigação originária iniciada com esteio na colaboração, mas sim nas gravações ambientais dissociadas do acordo.[40]
Eis o constrangimento ilegal a ser combatido por esta via
heroica: a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça impôs ao paciente o recebimento de denúncia em seu desfavor, a manutenção de afastamento do seu cargo de desembargador, além da continuidade da investigação originária, todos baseados, em última análise, nos elementos produzidos em colaboração celebrada e homologada com usurpação da garantia constitucional do foro por prerrogativa de função, na qual o colaborador, durantes meses, no curso de procedimento de negociação premiada, foi orientado e auxiliado por membros do MPRJ e da Polícia Federal sem atribuição a produzir gravações ambientais, inclusive com equipamentos fornecidos pelas autoridades, de modo a corroborar suas vazias declarações em face do paciente.
5. DO DIREITO
Conforme esmiuçado à exaustão, o recebimento de
denúncia e demais medidas adotadas contra o paciente se deram em persecução fundada nos elementos produzidos por Crystian Guimarães Viana, em negociação de acordo de colaboração celebrado junto a promotores do MPRJ com atuação na 1ª Instância e homologado por um desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Crystian Viana, utilizado como longa manus ministerial, foi
forjado a delatar quem tais promotores queriam ver delatado, tendo sido orientado a gravar terceiros durante meses, até mesmo sua própria advogada, diversas vezes utilizando equipamentos da Subsecretaria de Inteligência do Estado.
Ou seja, oficiosamente foram praticados atos
persecutórios, em uma espécie de investigação preliminar e extraoficial que atingiu o Desembargador Siro Darlan de Oliveira, em absoluta violação ao texto constitucional, notadamente à fixação de competência pelo foro por prerrogativa de função.
Quando enfim julgaram obter elementos de corroboração
suficientes, enviaram seus “achados” – que nada tinham de fortuitos – ao STJ, onde foi instaurado o INQ 1.199/DF e, a partir dele, ajuizada a APN 951/DF.
Eis o panorama que a autoridade coatora insiste em
ignorar, equivocadamente divorciando as gravações ambientais do procedimento de negociação acordo de colaboração premiada ao final celebrado com quem não tinha atribuição e homologado com quem não tinha competência, cuja ilegalidade foi expressamente reconhecida nos acórdãos prolatados pelo colegiado a quo.
Ab initio, para se compreender a real gravidade das
ilegalidades perpetradas contra o paciente e chanceladas pela Corte
Especial do Superior Tribunal de Justiça, cumpre tecer alguns comentários sobre a essência do instituto do foro por prerrogativa de função, garantia cuja violação está no centro da presente discussão.
5.1. Considerações sobre a garantia do foro por prerrogativa de função.
Considerando a relevância de determinados cargos ou
funções públicas, cuidou o constituinte brasileiro de fixar foros privativos para o trâmite persecutório contra pessoas ocupantes desses cargos, atentando-se para as graves implicações políticas que poderiam resultar das respectivas decisões judiciais.
Presume o legislador que os Tribunais de maior categoria
tenham mais isenção para julgar os ocupantes de determinadas funções públicas, por sua capacidade de resistir, seja à eventual influência do próprio acusado, seja às influências que atuarem externamente contra ele. A presumida independência do Tribunal de superior hierarquia é, pois, uma garantia bilateral, garantia contra e a favor do acusado[41].
Não obstante seu caráter de garantia constitucional, o
instituto não constitui efetivamente uma vantagem processual ao acusado, muitas vezes restringindo ou fulminando o duplo grau de jurisdição, conforme as sempre valiosas lições de Aury Lopes Jr.:
Ademais, é equivocada a ideia de que a prerrogativa de função constitui um grande benefício para o réu. Nem sempre. O argumento de que ser julgado por um tribunal
composto por juízes (em tese) mais experientes (o que não significa maior qualidade técnica do julgamento) é uma vantagem que esbarra na impossibilidade de um verdadeiro duplo grau de jurisdição.
Assim, um deputado estadual, julgado originariamente pelo Tribunal de Justiça, somente terá recurso especial e extraordinário dessa decisão, e, em ambos, está vedado o reexame da “prova” do processo, limitando-se a discutir eventual violação de norma federal ou constitucional (essas questões serão vistas posteriormente). Imagine-se então quem é julgado originariamente pelo Supremo Tribunal Federal; o duplo grau de jurisdição é inexistente.
Em que pese ser um tema em constante mutação
jurisprudencial, sua aplicação em relação ao paciente não dá margem a qualquer dúvida. Nos termos do artigo 105, inciso I, alínea “a” da Constituição Federal, compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar, originariamente, nos crimes comuns os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal”.
A Lei Orgânica da Magistratura cuidou de tutelar a
aplicação do instituto ainda quando da investigação preliminar, determinando em seu artigo 33, parágrafo único o seguinte:
Quando, no curso de investigação, houver indício da prática de crime por parte do magistrado, a autoridade policial, civil ou militar, remeterá os respectivos autos ao
Tribunal ou órgão especial competente para o julgamento, a fim de que prossiga na investigação.
À guisa ilustrativa do importante papel da referida
garantia na ordem democrática, observe-se que o instituto foi suspenso pelo regime militar no famigerado Ato Institucional nº 5 de 13 de dezembro de 1968. Note-se que pela sua redação, o Art. 5º reconhecia ao foro especial o status de direito político.
Art. 5º – A suspensão dos direitos políticos, com base neste Ato, importa, simultaneamente, em:
I – cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função;
Decerto não era interesse do regime ditatorial, sobretudo
em sua fase mais obscura, a preservação da imparcialidade e do necessário distanciamento dos magistrados de pressões políticas.
Não à toa, reestabelecida a ordem democrática, o
instituto foi alçado à categoria de garantia constitucional, cuja violação, por exemplo, enseja a ineficácia dos atos decorrentes de acordo de colaboração celebrado ao seu arrepio, vide o precedente estabelecido neste Pretório Excelso no Habeas Corpus 151605/PR, adiante detalhado, assim como deve ocorrer no presente caso.
Não há dificuldade em visualizar o desrespeito à garantia
em questão: promotores de justiça atuantes em Volta Redonda/RJ oficiosamente, sob o véu de estarem negociando acordo de colaboração, sem atribuição para tal, inquiriram Crystian Vianna sobre o paciente, bem como o orientaram a praticar atos persecutórios, notadamente gravações ambientais, os quais, mesmo atingindo o paciente, não foram imediatamente enviados ao Superior Tribunal de Justiça.
Chegou-se, enfim, ao absurdo do referido acordo ter sido
submetido à apreciação de juiz de primeiro grau, acabando homologado por um colega de Tribunal do paciente.
Demonstrado, assim, o flagrante desrespeito à referida
garantia constitucional do paciente no presente caso, conforme melhor delineado a seguir.
5.2. Atos persecutórios contra o paciente praticados usurpação de atribuição e de competência. Ineficácia dos atos de colaboração precedente da 2ª Turma.
Feitas tais considerações, observe-se que os provimentos
da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, ora combatidos, reconhecem com clareza a violação da referida garantia constitucional na celebração e homologação do acordo de colaboração premiada de
Crystian Vianna:
O acordo foi apresentado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, sendo submetido a homologação no Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Resende-RJ. Todavia, em 13.7.2016, o acordo foi homologado pelo Desembargador José Muñoz Piñeiro
Filho, designado relator no Tribunal de Justiça do Estado do
Rio de Janeiro, devido ao envolvimento, na organização
criminosa investigada na origem, de vereadores detentores de foro por prerrogativa de função naquela Corte estadual.
Desse modo, observo que a homologação daquele negócio jurídico foi realizada por juízo incompetente, eis que a citação de autoridade com prerrogativa de foro nesta Corte, ainda que por fato delituoso diverso e não relacionado diretamente com os fatos investigados na origem, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, atrai a competência do Superior Tribunal de Justiça para avaliar a regularidade, legalidade e voluntariedade da avença em sua integralidade Nesse contexto, as defesas têm razão quando expõem que o acordo de colaboração premiada, diante da menção ao Desembargador Siro Darlan em um dos termos de depoimento do colaborador Crystian Guimarães Viana (Anexo n. 10), deveria ter sido homologado pelo Superior Tribunal de Justiça, em atenção à prerrogativa de foro da autoridade citada. 52
De fato, o acórdão embargado reconheceu que o acordo de colaboração premiada, diante da menção ao Desembargador Siro Darlan em um dos termos de depoimento do colaborador Crystian Guimarães Viana (Anexo n. 10), deveria ter sido homologado pelo Superior Tribunal de Justiça, em atenção à prerrogativa de foro da autoridade citada.53
52 1º Acórdão 53 2º Acórdão
Não obstante, a autoridade coatora construiu
questionável engenharia para se abster de reconhecer a inafastável nulidade de todo o material produzido no INQ 1.199/DF.
Veja-se, em sínteses, as premissas adotadas pela
autoridade coatora, ora impugnadas:
- A instauração do INQ 1199/DF teria se baseado exclusivamente nas gravações ambientais produzidas por Crystian Viana, as quais não teriam relação com o acordo de colaboração, obtidas em serendipidade;
- Haveria distinguishing do presente caso em relação ao precedente fixado por esta Corte no HC 151.605/PR, sob o argumento de que não teriam sido perpetrados atos de persecução contra o paciente pelas autoridades incompetentes, razão pela qual não seria o caso de invalidação probatória;
- A ilegalidade no acordo apenas teria o condão de gerar efeitos entre os sujeitos celebrantes, conforme precedente estabelecido no HC 127.483 do
STF.
5.2.1. Indissociabilidade entre as gravações realizadas por Crystian Vianna e o seu acordo de colaboração premiada.
Em relação ao primeiro ponto, não se faz necessária farta
digressão. A cronologia dos fatos, notadamente as mensagens delineadas em capítulo anterior, afastam a premissa adotada pela autoridade coatora de forma peremptória.
É fato inequívoco que as gravações ambientais
mencionadas nos acórdãos combatidos foram obtidas sob orientação e com o auxílio de Delegado de Polícia Federal e dos promotores de justiça celebrantes do acordo de colaboração premiada de Crystian Vianna, inclusive com fornecimento de equipamento ao colaborador pela Secretaria de Inteligência e intensa troca de mensagens.
Não há que se falar, ainda, em serendipidade probatória. Além de o acordo ter sido enviado à homologação do Juízo de Resende/RJ contendo relato sobre o paciente, seu nome apenas surgiu naquela negociação após a provocação dos membros do Parquet, conforme o próprio Crystian consignou em depoimento prestado no Conselho Nacional de Justiça, já amplamente explorado neste writ.
Em precedente debruçado sobre situação semelhante, o Superior Tribunal de Justiça prescreveu com clareza a nulidade de investigação em que ocorra, fortuitamente, a menção de autoridade com prerrogativa de foro, quando os autos não foram enviados imediatamente à instância competente, mantendo-se atos persecutórios artificialmente no juízo absolutamente incompetente:
“2. O chamado fenômeno da serendipidade ou o encontro fortuito de provas – que se caracteriza pela descoberta de outros crimes ou sujeitos ativos em investigação com fim diverso – não acarreta qualquer nulidade ao inquérito que se sucede no foro competente, desde que remetidos os autos à instância competente tão
logo verificados indícios em face da autoridade.” [42]
Apenas em julho de 2016 foram enviadas ao STJ as
gravações e o termo de depoimento produzidos no âmbito do processo de negociação e celebração do acordo de delação premiada de Crystian Viana. Evidentemente tal remessa não foi realizada “tão logo verificados indícios em face da autoridade”, o que ocorreu ao menos desde final de dezembro de 2015 ou início de janeiro de 2016, após Promotores de Justiça sem atribuição inquirirem Crystian expressamente sobre o paciente!
Talvez para dar inexistente recentidade à descoberta de
elemento em face do Desembargador foi criado artificialmente a farsa do depoimento denominado Termo de Colaboração nº 10, com data de 21 de junho de 2016, mas com teor idêntico ao documento de 1º de fevereiro.
Não à toa esta Corte Suprema fixou entendimento no
sentido de que “cabe apenas ao próprio tribunal ao qual toca o foro por prerrogativa de função promover, sempre que possível, o desmembramento de inquérito e peças de investigação correspondentes, para manter sob sua jurisdição, em regra, apenas o que envolva autoridade com prerrogativa de foro, segundo as circunstâncias de cada caso”[43].
A prescrição dos Tribunais Superiores é clara: a autoridade
hierarquicamente superior é quem deve, portanto, decidir pela fixação de
competência tão logo surjam meros indícios contra autoridade com prerrogativa de foro em contexto persecutório, seja por menção em acordo de colaboração, seja no bojo de procedimento investigatório instaurado.
Tudo o que não foi providenciado no presente caso em
relação ao paciente.
5.2.2. Evidente identidade entre o presente caso e o precedente fixado no HC 151.605/PR pela 2ª Turma do STF.
Em relação à segunda premissa dos atos coatores, a
mesma cronologia fática acima esmiuçada cuida de confirmar a aplicabilidade do precedente fixado no HC 151.605/PR ao presente caso, e, portanto, a necessidade de ser decretada a nulidade de toda a investigação promovida no INQ 1199/DF, ab ovo, anulando-se, por decorrência, a ação penal originária, APN 951/DF.
O distinguishing operado no voto condutor utiliza como
princípios (i) a já afastada serendipidade das gravações ambientais com menção ao paciente, o que, segundo a autoridade coatora, não guardaria relação com a colaboração em si, conclusão inadmissível frente aos elementos constantes dos autos; (ii) a alegação de que no presente caso não teria sido praticado nenhum ato de persecução contra o paciente no primeiro grau de jurisdição, conclusão igualmente inadmissível.
Ambas as assertivas se mostram inválidas diante do
material disponibilizado àquele colegiado, descritos com exaustão no capítulo próprio.
Restou fartamente demonstrado que os próprios
promotores de Justiça de Resende-RJ, embora sem atribuição para tal, foram os responsáveis pela inclusão do paciente no acordo de Crystian Vianna, que talvez sequer narraria aquele fato caso não tivesse sido sobre ele expressamente perguntado.
Além disso, resta também demonstrado que foi sob
constante orientação e auxílio dos órgãos de investigação criminal, inclusive fornecendo os aparelhos para sua realização, que Crystian efetuou as gravações ambientais, atuando como longa manus ministerial a fim de obter elementos que corroborassem seus relatos, inclusive aquele pertinente ao Desembargador Siro Darlan.
Pois bem. O habeas corpus nº 151.605/PR, foi impetrado
em favor do ex-Governador do Paraná Carlos Alberto Richa, que em apertada síntese tinha contra si instaurado inquérito no Superior Tribunal de Justiça a partir de elementos da colaboração premiada de Luiz Antônio de Souza.
Não obstante envolver governador com foro por
prerrogativa de função perante o STJ, o acordo de colaboração premiada de Luiz Antônio de Souza havia sido celebrado com o Ministério Público do Paraná e homologado pelo juiz da 3ª Vara Criminal de Londrina.
A identidade fática com o presente caso salta aos olhos.
Assim como o Governador do Estado do Paraná, Siro Darlan de Oliveira, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, possui foro por prerrogativa de função perante o Superior Tribunal de Justiça, previsto no artigo 105 da Constituição Federal.
Do mesmo modo que Carlos Alberto Richa, o paciente
figurou em colaboração premiada que, não obstante seu foro constitucional por prerrogativa, restou celebrada com Promotores de Justiça de 1ª instância e homologada por juízo incompetente.
Igualmente ao que se passou no caso do governador, o
paciente teve contra si, posteriormente, instaurado inquérito no Superior Tribunal de Justiça com base única e exclusivamente em elementos da colaboração homologada sem respeito à sua prerrogativa de foro.
Tratando-se de idêntica questão jurídica em ambos os
casos, ao presente deve ser dada a mesma consequência.
5.2.3. Consequência jurídica da usurpação de atribuição e competência no processo de negociação e celebração de acordo de colaboração premiada: trancamento da investigação viciada desde a origem.
A autoridade coatora, fazendo uso de antigo precedente
deste Tribunal, consignou que a irregularidade na celebração do acordo apenas teria o condão de gerar efeitos entre os sujeitos celebrantes, ignorando-se os graves impactos ao delatado:
De fato, a inobservância da regra de competência quanto à homologação do acordo enseja, estritamente, a sua ineficácia em relação às partes daquele negócio jurídico (colaborador e órgão da acusação), o que pode vir a ser avaliado por ocasião da sindicabilidade dos termos da avença na prolação da sentença na ação penal movida contra o colaborador no primeiro grau de jurisdição.
(…)
Convém ressaltar que, segundo o entendimento firmado pelo STF no HC n. 127.483/PR, “o acordo de colaboração, como negócio jurídico personalíssimo, não vincula o delatado e não atinge diretamente sua esfera jurídica: res inter alios acta.” (HC n. 127.483, rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 27.8.2015, DJe-021 de 4.2.2016). Nessa perspectiva, sendo a homologação simples fator de atribuição de eficácia ao acordo de colaboração, a infringência de regra de competência na homologação da avença resulta em ineficácia da colaboração premiada, porém repercutindo de modo estrito na esfera jurídica do colaborador, diante de sua natureza de negócio jurídico personalíssimo.
Ignorou-se, contudo, o mais recente julgamento do HC 151.605/PR, no qual esta Turma firmou jurisprudência no sentido de que, em se tratando de hipótese distinta daquela analisada pelo Plenário da Corte no HC 127.483, por envolver as normas constitucionais de determinação de competência, o precedente do Tribunal Pleno não seria aplicável, assim como não o é no presente caso.
Eis o trecho do acórdão que define a questão de maneira
cristalina:
Assim, ainda que, ordinariamente, seja negada ao delatado a possibilidade de impugnar o acordo, esse entendimento não se aplica em caso de homologação sem respeito à prerrogativa de foro. Inaplicabilidade da jurisprudência firmada a partir do HC 127.483, rel. Min. Dias Toffoli, Pleno, julgado em 27.8.2017. [44]
Reconheceu-se, portanto, à autoridade cujo foro por
prerrogativa de função fora desrespeitado a legitimidade para impugnar a eficácia das provas colhidas em seu desfavor no bojo acordo de colaboração negociado e celebrado sem supervisão da autoridade competente.
Decidiu esta Colenda Turma que, em casos tais, a
consequência jurídica da inobservância das normas constitucionais é a ineficácia, em face do delatado com foro por prerrogativa de função, dos atos de colaboração premiada decorrentes de acordo de colaboração homologado em usurpação de competência.
Todos esses pontos foram decididos à unanimidade.
Por fim, como o inquérito para investigar o governador
havia sido instaurado com base material exclusiva nos elementos constantes do acordo de colaboração premiada de Luiz Antônio de Souza, prova ilícita
em relação à autoridade, a Turma decidiu pelo seu trancamento, sendo que só nesse ponto o Ministro Edson Fachin divergiu do relator, Ministro Gilmar Mendes.
O acórdão restou assim ementado:
Habeas Corpus. 2. Inquérito originário do Superior Tribunal de Justiça (…) 5. Legitimidade da autoridade com prerrogativa de foro para discutir a eficácia das provas colhidas mediante acordo de colaboração realizado sem a supervisão do foro competente. A impugnação quanto à competência para homologação do acordo diz respeito às disposições constitucionais quanto à prerrogativa de foro. Assim, ainda que, ordinariamente, seja negada ao delatado a possibilidade de impugnar o acordo, esse entendimento não se aplica em caso de homologação sem respeito à prerrogativa de foro. Inaplicabilidade da jurisprudência firmada a partir do HC 127.483, rel. Min. Dias Toffoli, Pleno, julgado em 27.8.2017.6. Ineficácia, em relação ao Governador do Estado, dos atos de colaboração premiada, decorrentes de acordo de colaboração premiada homologado em usurpação de competência do Superior Tribunal de Justiça. 7. Tendo em vista que o inquérito foi instaurado tendo por base material exclusiva os atos de colaboração, deve ser trancado. 8. Concedida a ordem, para reconhecer a ineficácia, em relação ao paciente, das provas produzidas mediante atos de colaboração premiada (…)[45]
Não há dúvidas de que o INQ 1.199/DF foi instaurado “tendo por base material exclusiva os atos de colaboração”, quais sejam, as gravações produzidas por Crystian Viana no processo de negociação e celebração de seu acordo de colaboração premiada, por orientação e com o auxílio dos órgãos de investigação sem atribuição, que inclusive forneceram equipamentos de gravação para o colaborador.
Isso tudo com o objetivo obter elementos de corroboração
para os fatos delatados, entre eles aquele envolvendo o ora paciente.
O precedente versa exatamente sobre a violação ora
combatida, devendo ser aplicada ao presente caso, portanto, a mesma consequência jurídica: declaração de ineficácia da colaboração em relação ao paciente, com o subsequente trancamento da Ação Penal 951/DF e do INQ 1.199/DF, ambos decorrentes de prova ilícita.
As críticas tecidas pelo Ministro Gilmar Mendes às
providências tomadas pelos membros do Ministério Público de primeira instância merecem ser importadas:
Aparentemente, o Ministério Público local não apenas invadiu, por duas vezes, a competência da ProcuradoriaGeral da República e do Superior Tribunal de Justiça, mas também o fez oferecendo ao acusado benefícios sem embasamento legal, gerando uma delação pouco confiável e não corroborada por outros elementos, a qual foi reputada suficiente para a abertura das investigações contra o Governador do Estado.
Ainda naquela sessão, o Ministro Dias Toffoli relatou
situação em que se recusou a homologar o acordo de colaboração premiada porque o Procurador-Regional da República, usurpando atribuição da PGR, havia indagado o colaborador sobre parlamentar federal:
“Nesse caso que fiz referência, de minha relatoria, recebi e verifiquei que um Procurador-Regional da República assinou um acordo de colaboração, fez perguntas a respeito de um parlamentar federal e encaminhou, diretamente, à distribuição do Supremo o pedido de homologação. Evidentemente que não o fiz. Encaminhei, com essas anotações, um despacho ao eminente Procurador-Geral da República de então, Dr. Rodrigo Janot, que, ao fim e ao cabo, veio a concordar realmente que a competência, dele próprio, tinha sido usurpada por esse procurador-regional.”
Exatamente como no presente caso, em que Promotor de Justiça do MPRJ com atuação na 1ª instância indagou o colaborador Crystian Viana logo nas primeiras tratativas de seu acordo, realizadas no final de dezembro ou 2015 ou início de janeiro de 2016, sobre suposto fato envolvendo o paciente, mas encaminhou o procedimento ao STJ apenas muitos meses depois, em julho de 2016.
Em relação à usurpação da competência e ineficácia do
acordo, o Ministro Edson Fachin, inclusive, manifestou-se em total convergência ao discorrido pelo restante da Turma,
Ou seja, naquele caso, eu assentava, precisamente na linha do que trouxe mutatis mutandis o eminente MinistroRelator, e nisso subscrevo por inteiro o voto, no segmento da competência, do eminente Ministro-Relator, eis que aqui incide a alínea “a”, inciso I, do artigo 105 da Constituição Federal, que estabelece foro por prerrogativa de função e, inequivocamente, foi feita referência a governador do estado. Portanto, nessa questão da competência, não tenho dúvida alguma em assentar, como não poderia deixar de ser, em homenagem e respeito integral à Constituição, a competência do Superior Tribunal de Justiça. (…)Portanto, eu estou acompanhando o voto do eminente Ministro Gilmar Mendes, concedendo parcialmente a ordem, limitada em reconhecer a ineficácia, em relação ao paciente, das provas produzidas decorrentes da colaboração premiada de Luiz Antônio de Souza.
Esse ponto foi julgado à unanimidade, havendo
divergência do Ministro Edson Fachin apenas quanto à consequência do reconhecimento da ineficácia, decidida pela Turma como sendo o trancamento do inquérito.
Com as devidas vênias, entende-se que o trancamento da APN 951/DF, é precisamente o que deve ocorrer no presente caso, na linha do entendimento prevalecente neste colegiado.
É inequívoco que a investigação originária foi
determinada com base exclusivamente no Termo de Colaboração nº 10 de Crystian Viana e das gravações produzidas no bojo de seu acordo ilegalmente conduzido.
Ou seja, instaurada tendo como base material exclusiva
atos de colaboração do acordo negociado, celebrado e homologado com usurpação de atribuição da Procuradoria-Geral da República e de competência do Superior Tribunal de Justiça, em flagrante violação à constitucional prerrogativa de foro do paciente, o Desembargador Siro Darlan de Oliveira.
A partir do momento em que o paciente, por provocação
de Promotor de Justiça sem atribuição, passou a figurar na delação premiada de Crystian Viana como delatado já nas primeiras tratativas para o acordo, realizadas entre final de dezembro de 2015 e início de janeiro de 2016, era medida imperiosa o encaminhamento do colaborador e de todo o processo de colaboração à Procuradoria-Geral da República com atuação junto ao Superior Tribunal de Justiça.
Ao invés disso, os promotores com atuação na 1ª Instância,
mesmo sem atribuição para tanto, prosseguiram até julho de 2016 atuando no processo de negociação do acordo de colaboração de Crystian Guimarães Viana em conjunto com Delegado de Polícia Federal, orientando e auxiliando o delator a gravar os demais investigados, inclusive com fornecimento de equipamentos da Subsecretaria de Inteligência do Estado, de modo a produzir elementos de corroboração de seus relatos.
Tudo isso sem a necessária supervisão da Corte
competente, qual seja, o Superior Tribunal de Justiça, perante a qual o processo de negociação da colaboração premiada em que essa investigação foi subterraneamente conduzida deveria estar tramitando ao menos desde janeiro de 2016, quando nela passou a figurar o paciente.
A ilegalidade perdurou por meses, tendo sido toda a base
material da instauração do INQ 1.199/DF produzida nesse período e com participação de Promotores de Justiça sem atribuição.
Eis o trecho do Voto do Ministro Gilmar Mendes no HC 151.605 sobre a consequência jurídica da usurpação de atribuição e de competência em processo de negociação, celebração e homologação de colaboração premiada, cujo entendimento foi acompanhado por mais três Ministros integrantes da 2ª Turma:
Portanto, o caso é de reconhecimento da ineficácia, em relação ao Governador do Estado, dos atos de colaboração premiada, decorrentes de acordo de colaboração homologado em usurpação de competência do Superior Tribunal de Justiça.
As provas devem ser excluídas do inquérito.
Tendo em vista que o inquérito foi instaurado tendo por base material exclusiva os atos de colaboração, o inquérito deve ser trancado.
Deflagrada a ação penal a partir de elementos produzidos
no INQ 1.199/DF, e instaurado esse com base única e exclusivamente em prova ilícita em relação ao paciente, o trancamento certamente é a medida que se impõe.
Destaca-se, nesse ponto, a perfeita colocação do Ministro Dias Toffoli naquele julgamento, ao manifestar-se em oposição a uma possível ratificação dos atos praticados a partir de acordo de colaboração celebrado em afronta à Constituição Federal:
Pois bem. E a maneira de coibir isso é a decretação de nulidade de tudo quanto foi feito. Não se pode ratificar, como quis fazer o Superior de Justiça, aquilo que, de nascença, é uma excrescência. Porque, senão, nós vamos permitir que isso ocorra. “Ah, faz e depois ratifica”.
De fato, permitir a convalidação de provas produzidas em
acordo de colaboração firmado ao arrepio da Carta Magna significaria não apenas a leniência, mas verdadeiro incentivo ao desrespeito das balizas legais e constitucionais, necessárias à utilização de tão delicado meio de obtenção de prova no Estado Democrático de Direito.
Demonstrado que a questão jurídica trazida pelo presente
writ é exatamente idêntica àquela analisada no HC 151.605, deve ela ser julgada de igual forma.
O que ora se impugna não é a colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, celebrada com órgão sem atribuição e homologada por autoridade incompetente. O que se questiona, apenas e tão somente, são os efeitos concretos resultantes dessas ilegalidades.
Ou seja: podem os elementos de colaboração premiada
celebrada e homologada sem observância das normas constitucionais de determinação de atribuição para investigação e competência, inclusive as gravações realizadas por Crystian Vianna sob orientação e auxílio do MPRJ e do DPF Jaime Júnior, ser utilizados para instaurar inquérito e posterior oferecimento denúncia em desfavor do paciente?
A resposta é evidentemente negativa, conforme
pacificado por esta Turma no HC 151.605.
Há ainda outra distinção em relação ao HC 127.483,
precedente utilizado pela autoridade coatora, que merece ser salientada.
No HC 127.483, o cerne da impugnação do delatado era
direcionada à irregularidade formal na celebração do acordo em si, especificamente levantando suspeitas sobre a personalidade do colaborador e, portanto, sua aptidão para a celebração do negócio jurídico.
O Plenário, na ocasião, decidiu que a homologação, por
si só, não afetava a esfera jurídica de terceiros.
Situação absolutamente distinta da presente. Aqui não se
está impugnando a figura do colaborador, ou o ato em si de homologação do acordo, mas sim suas ilegais repercussões em relação ao paciente.
Ao contrário da dinâmica no referido precedente, no
presente caso verifica-se se a esfera jurídica do paciente, o Desembargador Siro Darlan de Oliveira, foi afetada por inúmeras medidas restritivas e constritivas de direitos fundamentais, boa parte ainda em efeito. Especialmente o oferecimento de denúncia e seu recebimento lastreados naqueles elementos ilegalmente produzidos no processo de negociação, celebração e homologação da colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana.
Veja-se que o próprio acórdão do HC 127.483, no seu
parágrafo “7”, prevê a possibilidade de impugnação nestes casos:
7. De todo modo, nos procedimentos em que figurarem como imputados, os coautores ou partícipes – no exercício do contraditório – poderão confrontar, em juízo, as declarações do colaborador e as provas por ele indicadas, bem como impugnar, a qualquer tempo, as medidas restritivas de direitos fundamentais eventualmente adotadas em seu desfavor.[46]
É exatamente esse o objetivo da presente impetração:
impugnar medidas persecutórias ilegalmente decretadas em desfavor do paciente, notadamente o recebimento de denúncia com base material exclusiva em elementos decorrentes de colaboração premiada negociada e celebrada com membros do Ministério Público sem atribuição para tal, e homologada por autoridade incompetente.
Repita-se: não se pretende impugnar o acordo em si, mas
sim seus efeitos na esfera jurídica do paciente.
Conforme já ressaltado, além de duas rodadas de busca
e apreensão, foi decretado em desfavor do paciente no INQ 1.199/DF e na APN 951/DF, na qual hoje figura como réu, (i) o afastamento do sigilo fiscal e bancário por um período de quase cinco anos, (ii) afastamento cautelar do exercício do cargo (iii) proibição de contato com assessores e servidores do TJRJ, (iv) proibição de contato com os demais investigados, (v) bloqueio de bens até o limite de um milhão de reais e (vi) o afastamento de sigilo de seus dados telefônicos.
Frise-se: todas as medidas possíveis, à exceção da prisão
cautelar.
Tudo isso a partir, diretamente e por derivação, de prova
ilícita, isto é, dos elementos de colaboração premiada ineficazes em relação a Siro Darlan de Oliveira porque celebrada com representantes do Ministério Público sem atribuição e homologada por Tribunal de Justiça estadual, em manifesta violação, constatável de plano, ao art. 105, inciso I, alínea “a” da Constituição Federal, que dispõe sobre o foro do paciente perante o Superior Tribunal de Justiça.
As lesões ora descritas à esfera jurídica do paciente,
culminadas em colocá-lo na posição de réu no bojo da maculada Ação Penal 951/DF, impõem a concessão da presente ordem.
6. PEDIDO LIMINAR
Não se ignora que a concessão de medida liminar em
habeas corpus se trata de hipótese excepcional, justificada apenas quando o constrangimento ilegal puder ser constatado de plano (fumus boni iuris) e a demora na prestação jurisdicional, ocasionar graves danos ao paciente (periculum in mora).
Ambos os requisitos estão presentes.
No procedimento de sua colaboração premiada, Crystian Guimarães Viana foi provocado a acusar o paciente da prática de crime por promotores sem atribuição para tal, sendo em seguida por eles e por Delegado de Polícia Federal orientado e auxiliado a produzir as gravações posteriormente utilizadas em desfavor do paciente.
Sendo Siro Darlan de Oliveira desembargador de Tribunal
estadual, está prevista na Constituição Federal sua prerrogativa de foro perante o Superior Tribunal de Justiça, com consequente atribuição da Procuradoria-Geral da República para investigá-lo.
Mas os Promotores de Justiça de 1ª instância não
remeteram os autos ao órgão competente, terminando por celebrar o acordo com Crystian, mesmo sem possuir atribuição para tanto.
Por meses após a delação do suposto fato criminoso
praticado pelo paciente, o procedimento de colaboração premiada continuou tramitando nas instâncias inferiores até a sua homologação pelo TJRJ, em 13 de julho de 2016, restando usurpada, assim, a competência do Superior Tribunal de Justiça.
Os elementos produzidos no processo de negociação
dessa colaboração celebrada e homologada em usurpação de atribuição e de competência – e, portanto, ineficaz em relação ao paciente, nos termos do acórdão desta 2ª Turma no HC 151.605 – serviram como base material exclusiva para a instauração do INQ 1.199/DF, em agosto de 2017.
As gravações produzidas por Crystian com ajuda do MPRJ – ou melhor, produzidas pelo MPRJ através de Crystian – serviram, ainda, como fundamento isolado para a instauração de investigação em seu desfavor, resultando na APN 951/DF, com denúncia já recebida.
Assim, o fumus boni iuris é indiscutível, tamanhas as
ilegalidades na produção dos elementos que serviram para esse incrível constrangimento ao paciente.
O periculum in mora é igualmente evidente.
O paciente foi posto indevidamente na condição de réu na APn 951/DF, circunstância que, por si só, renova diariamente a urgência no provimento do presente writ.
Afora o potencial prejuízo à própria administração da justiça, na medida em que a instrução do referido processo se avizinha, correndo-se concreto risco de realização de diversos atos processuais de razoável complexidade em ação penal absolutamente natimorta, conforme ora exposto.
Além disso, o INQ 1.199/DF segue em curso, não tendo sido
finalizado por pedido do próprio MPF ao oferecer a denúncia.
Assim, Siro Darlan permanece alvo de investigação na
qual não existe qualquer reserva na decretação de sucessivas medidas violadoras de seus direitos fundamentais.
Encontra-se há quase um ano afastado do exercício de
seu cargo e com os bens bloqueados, até o valor de um milhão de reais, por força de decisão referendada pela Corte Especial do STJ, de modo que, a cada dia que passa, agrava-se o constrangimento ilegal.
Desta feita, requer-se a concessão de medida liminar
apenas e tão somente para suspender o andamento da APN 951/DF e do INQ 1.199/DF do qual ela deriva, mantidas as demais medidas cautelares, até o julgamento de mérito do writ.
7. PEDIDO
Pelo exposto, requer-se a concessão da medida liminar
acima pleiteada e, no mérito, a concessão da presente ordem para: (i) reconhecer a ineficácia dos elementos produzidos mediante atos de colaboração premiada de Crystian Guimarães Viana, inclusive as gravações por ele realizadas com apoio e orientação do MPRJ, em relação ao paciente, cuja prerrogativa de foro restou violada; (ii) declarar a ilicitude por derivação de todos os elementos de prova obtidos no INQ 1.199/DF a partir da colaboração, pois igualmente contaminados pela violação às normas constitucionais de determinação de competência; (iii) determinar o trancamento do INQ 1.199/DF, instaurado com base material exclusiva nos atos e elementos da colaboração premiada, e da APN 951/DF, a partir dele originada.
Índice de documentos na página seguinte.
Pede deferimento.
Do Rio de Janeiro para Brasília, 1º de abril de 2021.
Geraldo Prado OAB/RJ nº 46.484 | Carlos Eduardo Machado OAB/RJ nº 46.403 |
João Pedro Drummond OAB/RJ nº 206.955 | Ignácio Machado OAB/RJ nº 229.767 |
[1] Peça nº 2 – Procuração. Numeração das peças conforme índice do sistema de processo eletrônico do Supremo Tribunal Federal.
[2] Rua Beco da Música, n. 175, sala 107, Centro, Rio de Janeiro-RJ – Lâmina IV do TJRJ. 3 Peças nº 3 e 4 – Atos Coatores.
[3] O depoimento prestado por Crystian Viana no referido PAD será melhor abordado posteriormente neste writ, no capítulo que trata dos fatos relevantes para a impetração.
[4] “Para evitar ‘genocídio’, desembargador do RJ manda 30 para prisão domiciliar”. Notícia disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-mar-17/evitar-genocidio-desembargadormanda-30-prisao-domiciliar. Acesso em 22 de mar. 2021.
[5] Peça nº 5 – Notícias de jornais. Entre elas, nota de jornal sobre o Prêmio USP de Direitos Humanos conferido ao Desembargador Siro Darlan no ano de 2005.
[6] Resolução nº 703/2011 da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, disponível em: http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/CONTLEI.NSF/4e01814e64be553c032564ff00614601/070767faf0783 7c803256ae800671178?OpenDocument. Acesso em: 26 de mar. 2021.
[7] Cf. Peça nº 5 – Notícias de jornais. Entre elas, notícias de jornais que, à época, noticiaram o fato: “TJ-RJ condena procurador”; “Promotor indenizará desembargador”; “Promotor é condenado por ofender Siro Darlan”.
[8] Ação Indenizatória nº 2005.001.067690-7.
[9] Peça nº 7 – Notícia de crime apresentada pela AMAERJ em razão dos vazamentos.
[10] Voto do Min. Gilmar Mendes no HC 164.493/PR, pg. 78
[11] Vídeo da Sessão da Segunda Turma do STF do dia 09/03/21, ao minuto 00:55:26. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=oG4PukmrHR0
[12] Voto, pg. 82 e Vídeo da Sessão da Segunda Turma do STF do dia 09/03/21, ao minuto 1:59:30. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=oG4PukmrHR0
[13] Peça nº 8 – Página de decisão do Min. Relator no INQ 1.199 com a transcrição do áudio (a íntegra dessa decisão segue anexa como Peça nº 29). Contudo, em seu voto quando do recebimento da denúncia, o Min. Relator não mencionou a devolução do dinheiro.
[14] https://oglobo.globo.com/rio/mp-obtem-novo-mandado-de-prisao-contra-acusado-defraude-em-resende-18015658
[15] Peça nº 9 – Transcrições do Depoimento de Crystian Viana no PAD CNJ nº 000692694.2018.2.00.0000.
[16] Peça nº 10 – Denúncia e Cota Ministerial na Ação Penal nº 0054858-83.2017.8.19.0000, oferecida contra coinvestigados de Crystian Viana e Ricardo Abbud, fl. 11.
[17] Peça nº 11 – Informações prestadas por agente da Superintendência de Inteligência. Primeira informação.
[18] Cf. Peça nº 11 – Informações prestadas por agente da Superintendência de Inteligência. Segunda informação.
[19] Peça nº 12 – Transcrição da gravação de Crystian com Sandro.
[20] Peça nº 13 – Conversas entre Jaime e Crystian, apresentado pelo MPRJ como Anexo nos autos da Ação Penal nº 0054858-83.2017.8.19.0000. Juntado pela defesa do paciente nos autos da APN 951/DF em 10 de dezembro de 2020.
[21] Peça nº 14 – Transcrição do diálogo entre Crystian Viana e Luciano.
[22] Cf. Peça nº 11 – Informações prestadas por agente da Superintendência de Inteligência. Primeira informação.
[23] Peça nº 15 – Transcrição do diálogo entre Crystian Viana e Marcelo (Parte 1 de 2).
[24] Peça nº 16 – Transcrição do diálogo entre Crystian Viana e Marcelo (Parte 2 de 2).
[25] Peça nº 17 – Termo de depoimento datado de 1º de fevereiro de 2016.
[26] Peça nº 18 – Pedido de homologação da colaboração premiada de Crystian Viana, envolvendo vereadores e também o paciente, dirigido ao Juízo de 1ª Instância de Resende, datado de 17 de fevereiro de 2016.
[27] Cf. Peça nº 9 – Transcrições do depoimento de Crystian Viana no PAD CNJ.
[28] Peça nº 20 – Termo de Colaboração nº 10.
[29] Peça nº 21 – Notícias de fato encaminhadas pelo MPRJ à PGR com atuação junto ao STJ, a primeira datada de 11 de julho de 2016 e a segunda, de 6 de setembro de 2016.
[30] Peça nº 22 – Decisão homologando acordo de colaboração de Crystian Viana, proferida pelo Desembargador José Muiños Piñeiro Filho em 13 de julho de 2016.
[31] Peça nº 27 – Decisão decretando a primeira busca e apreensão contra o paciente.
[32] Peça nº 28 – Petição da defesa do paciente, de 17 de outubro de 2019, apontando a usurpação de atribuição ocorrida no processo de negociação e celebração da colaboração de Crystian Viana.
[33] Peça nº 29 – Decisão decretando a segunda busca e apreensão e outras cautelares. 43 Peça nº 30 – Petição apresentada pela defesa do paciente em maio de 2020 apontando a usurpação de atribuição e de competência.
[34] Peça nº 31 – Resposta preliminar apresentada pelo paciente na APN 951/DF.
[35] Cf. Peça nº 3 – Acórdão do julgamento que recebeu a denúncia oferecida na APN 951/DF.
[36] Peça nº 32 – Embargos de declaração opostos pela defesa do paciente na APN 951/DF.
[37] Peça nº 33 – Parecer do MPF quanto aos embargos.
[38] Peça nº 34 – Petição da defesa do paciente de 10 de dezembro de 2020 juntando nos autos da APN 951/DF os novos documentos obtidos, até então desconhecidos.
[39] Peça nº 35 – Certidão de importação dos documentos em arquivo .pdf.
[40] Cf. Peça nº 4 – Acórdão do julgamento que rejeitou os embargos declaratórios.
[41] Renato Brasileiro de Lima , Manual de processo penal: volume único /– 8. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2020.p. 562
[42] RHC 60.871/MT, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 4.10.16).
[43] Inq 4104, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 22/11/2016,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-259 DIVULG 05-12-2016 PUBLIC 06-12-2016
[44] HC 151605, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 20/03/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-183 DIVULG 22-07-2020 PUBLIC 23-07-2020.
[45] HC 151605, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 20/03/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-183 DIVULG 22-07-2020 PUBLIC 23-07-2020.
[46] HC 127483, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 27/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 03-02-2016 PUBLIC 04-02-2016.