O mal maior da guerra às drogas

Imagens ilustrativasDESTAQUESDIREITOS HUMANOSO mal maior da guerra às drogas  MAZOLA2 dias ago 0  4 min read  23552

Por Siro Darlan –

O jornal a Folha de São Paulo publicou em seu editorial um grito de alerta para o assassinato por preconceito, enclausuramento, e perseguição aos “inimigos” eleitos na guerra à drogas, que na verdade é uma guerra aos grupos étnicos e socialmente empobrecidos. Em sua prática escravocrata e persecutória, o legislador autoriza a polícia a matar “no estrito cumprimento do dever legal” e nos famosos “auto de resistência” a população indesejada, assim como aqueles que escapam da violência policial, passam pelas lentes lenientes do ministério público, e conta com a homologação negligente de um judiciário conservador e racista.

Não é sem motivos que a política para drogas no Brasil é a pior entre 30 países classificados no Global Drug Policy Index.

Segundo a pesquisa a política é de fraco desempenho porque encara as drogas como assunto de polícia e justiça, quando é nitidamente uma questão de saúde pública. O álcool, o tabaco, e outras drogas receitadas pela medicina apontam o caminho de abordagem correta, mas com as classificadas ilícitas, sem qualquer fundamento científico, servem como madeira para incendiar os indesejáveis.

Ao entregar à uma despreparada polícia o papel de selecionar o tipo penal a ser aplicado, prepondera a corrupção e o racismo que autorizam invasões de domicílio, violência indiscriminada contra as comunidades pobres, prisões arbitrárias e torturas. Essas respostas extremas por parte do Estado, além de sua inutilidade, nos últimos anos aumentou em muito a venda e consumo de drogas, e custo operacional altíssimo, só tem causado mais mortes que as causadas pelas drogas em si e um aprisionamento que muito custa à sociedade. No Brasil, gasta-se muito com uma estratégia ineficaz. A cifra estimada para a despesa de 2017 com a repressão apenas em São Paulo e no Rio de Janeiro é de R$ 5,2 bilhões, segundo estudo publicado em março deste ano e coordenado pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC).

No Brasil prende-se muito, em especial jovens negros e pobres, e gasta-se muito com repressão com pouca eficácia. Embora não adote a pena de morte, o Brasil exibe níveis alarmantes de letalidade policial —foram 6.416 mortes em 2020.

Enquanto a população entre os anos de 1974 a 2020 teve um aumento de 127,35%, o crescimento da população encarcerada teve um aumento de 1905,91%, e ainda há quem destile que há impunidade no Brasil. Pode até haver, mas em outro segmento da população, sobretudo entre os mais ricos. Em 2016, 26 % dos encarcerados eram do tipo penal de tráfico de entorpecente, com igual percentual para o crime de furto. Considerando que o tráfico é uma forma de trabalho que sustenta muitas famílias, temos 54% de crimes contra o patrimônio familiar. Já a população feminina no cárcere constitui um percentual de 62% de crimes vinculados ao tráfico de drogas. São as denominadas “mulas” que poderiam tranquilamente estar respondendo processo em liberdade ou em prisão domiciliar, já que a grande maioria é construída por mães.

Enquanto isso, na linha do atual governo foi lançada uma nova Política Nacional sobre as drogas com foco na repressão, enquanto continua pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal um posicionamento acerca da criminalização da posse para uso pessoal, pela omissão legislativa, milhares de brasileiros e brasileira deixa de ter acesso à cannabis para uso medicinal e industrial.

Há anos alguns países implementaram políticas mais voltadas para o tratamento dos usuários de drogas, descriminalizando o comércio e uso de todas as drogas, com resultados exitosos.

Diversos especialistas em medicina e em direito já se manifestaram no sentido da mudança do foco do judiciário e da criminalização para o da medicina, tendo em vista o insucesso de mais de 50 anos de “guerra as drogas” com milhares de mortos entre policiais, criminosos e inocentes, sem qualquer redução nesse promissor comércio, que classifica esse mercado como o 7º mais rendoso do Planeta.

SIRO DARLAN – Editor e Diretor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Juiz de Segundo Grau do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos na ENSP; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Coordenador Rio da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.