Oh mundo tão cruel!

COLUNISTASGERALOh mundo tão cruel!  MAZOLA6 dias ago 0  7 min read  19452

Por Siro Darlan –

Conheci uma dentista que candidatou-se ao cargo de vereadora de uma cidade fluminense, onde sou Cidadão Honorário. Essa mulher negra ganhou as eleições e tem dedicado seu mandato a cuidar de seu povo, representando-o com galhardia e dedicação, mesmo em tempos de pandemia sanitária. Sou fã de um ativista que dedica sua inteligência e seus atributos pessoais à comunidade, sendo destacado líder no Jacarezinho e assessor parlamentar atuante e responsável, que recentemente foi covardemente exposto e execração pública por ser parente de uma traficante. Não conheço essa parenta, mas se tiver escolhido a profissão de traficante de drogas, que diferença faz se estivesse num boteco vendendo a cachaça do Papa, o vinho do Pierre? E onde chega o descaramento midiático que condena uma pessoa por sua relação de parentesco?

Afinal, o presidente atual pode ter muitos defeitos, mas o fato de sua mulher ter praticado estelionato e sua sogra ter sido traficante não o desqualifica em nada. Salvo na sua orientação, e dessa discordamos, “que bandido bom é bandido morto”. Nesse caso já estaria viúvo e sem sogra. Mas felizmente não são esses os casos a que se refere Sua Exa. que há essa altura já não teria mais amigos vivos.

Assisti a uma conferência do Professor Bernard Charlot, autor do livro Educação ou Barbárie que tendo em vista a barbárie que se instalou em nossa pátria, aliás a bandeira verde e amarela é de todos os brasileiros e brasileiras e não apenas dos fascistas que se apoderaram dos símbolos pátrios comuns, devemos olhar para a educação como um direito humano inalienável, porque próprio do ser humano. Segundo o consagrado Doutor, a Educação ocupa quase um terço ou um quarto da vida do ser humano. A cultura humana e cumulativa. Cada geração humana acumula novas ferramentas. Autocatalíptica, porque é uma reação que se entende a si mesmo. A cultura produz cultura. O uso da cultura é como ferramenta. As características da cultura vão ter consequências antropológicas.

Embora a cultura humana seja acumulativa, alguns movimentos políticos insistem em começar do zero, regredindo no tempo e na aprendizagem, sobretudo os comandos conservadores e positivistas que não conseguem olhar adiante e olhar para o futuro, que acontece a cada gesto, a cada segundo que vivemos. Na ideologia dos direitos humanos os homens nascem e permanecem em condições iguais em direitos. Trata-se de uma mentira porque nem no dia do parto somos iguais. Nascemos em condições diferentes e em cenários variados, assim como em condições sociais.

Até o próprio Filho de Deus nasceu numa manjedoura para estabelecer que sua mensagem é destinada a todos e todas as diversidades humanas e não humanas.

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É a educação e a aprendizagem que nos diferencia em cada época da humanidade. O livro da vida nos estrutura como pessoas. O ser humano é livre, mas é uma mentira porque pode ser um fato desejado, mas as desigualdades sociais restringem essa liberdade plena. Qual é a realidade? Direitos Humanos são direitos? É uma realidade? Ou é um desejo a ser atingido? Direitos Humanos: o que se entende por essa expressão? Tentam esconder as desigualdades sociais com esse discurso. Ideal regulador exigência ético-social ou realidade prática efetiva?

Mesmo na primeira experiência de democracia, a realidade já desmentia o discurso. A igualdade apregoada pela democracia da Ágora já excluía o escravo, a mulher e a criança são a mesma coisa segundo a história. Sempre, até o momento, com todos os avanços civilizatórios há categorias de humanos que são excluídos e desrespeitados. Aristóteles dizia que cada um vive segundo sua natureza. O macho comanda a mulher e o escravo, que comandam o filho. Dizia, por natureza as mulheres devem obedecer os homens. É ultrapassado? Não, ainda é nossa realidade. São elementos usados na história, eminentemente machista para evocar a própria natureza. O caráter arbitrário e ideológico da concepção unilateral de natureza humana. O que abordamos acima é a continuação desse preconceito histórico, quando se atribui acertas pessoas defeitos e falhas que não lhes pertence.

É conhecido pelos pedagogos especializados que só aprende quem se mobiliza intelectualmente, quando encontra sentido e prazer naquilo que aprende. Como pode se mobilizar quando ensinam coisas tão chatas nas escolas? Como mobilizar jovens em situação de risco permanente, seja por lhes oferecer uma escola ultrapassada e desinteressante, seja por habitar espaço onde tudo que aprende na escola lhes é negado na realidade prática? Para se mobilizar é preciso um desejo. Qual seria o desejo de um jovem das comunidades sociais mais humildes? O desejo de aprender e a vontade de ensinar.

O ser humano é 100% social e 100% singular.

Qual é esse estranho ser humano totalmente social e totalmente singular. A identidade social e singular da condição humana. Eis a dialética da existência humana. Humanização, socialização e singularização – dimensões antropológicas do processo educacional. O realismo cínico para justificar a desigualdade social. O pai tem dinheiro para pagar uma escola boa, ou não e vai para uma escola ruim. Temos que considerar qual é a realidade de vida das crianças, dos jovens das classes populares para estudar, para conhecer, para construir o desejo? No cotidiano vemos banalização da violação de direitos humanos – violação/relação com o singular e a capacidade humano genérica… A escola impõe práticas tradicionais, pedagogia da disciplina, da norma, contra o desejo.

Não há, hoje, uma pedagogia “contemporânea”, que seria equivalente ao que foram as pedagogias “tradicionais” ou “novas”. Elas ofereciam um tipo de homem para educar, uma proposta antropológica. Atualmente, o objetivo é: ter um bom trabalho mais tarde e melhorar a posição do país nas classificações internacionais.

Isso não significa que não haja discursos novos: neuroeducação, cibercultura, transhumanismo. Mas eles se fundam em uma visão empobrecida e simplista do ser humano ou anunciam o fim próximo do Sapiens. Enquanto isso, cada pessoa tenta sobreviver como pode com seus filhos ou alunos e a lógica do desempenho e da concorrência devora nosso mundo.

A educação que está hoje implantada nos segmentos educacionais se assemelha mais a um barbárie distorcida da realidade do ser humano e desprovida de um contexto antropológico, sendo mais focada no desempenho e na concorrência em um mercado de trabalho do que educar para a cidadania e envolver os educandos como responsáveis pelo futuro do planeta.

Os CIEPs – Centros Integrados de Educação Pública, popularmente apelidados de Brizolões, foram um projeto educacional de autoria do antropólogo Darcy Ribeiro, que os considerava “uma revolução na educação pública do País”. (Wikipédia)

Educar não é ensinar, educar é mais difícil do que ensinar, pois para ensinar é preciso saber e para educar é preciso ser. Uma sociedade de concorrência generalizada. Não se trata de formar homens ou mulheres, mas um concorrente permanente. Precisamos dar espaço nas escolas para ouvir as crianças… Elas indicam os caminhos metodológicos para a pratica da pedagogia dos sentidos e dos sentimentos.

A educação que está hoje implantada nos segmentos educacionais se assemelha mais a um barbárie distorcida da realidade do ser humano e desprovida de um contexto antropológico, sendo mais focada no desempenho e na concorrência em um mercado de trabalho do que educar para a cidadania e envolver os educandos como seres em transformação e em formação de sua própria história. A volta da barbárie, fanatismo religioso, ódio, assedio com as tecnologias digitais. Não se considera o outro plenamente humano. Humanos de vários graus. Negros, mulher, imigrantes é uma categorização de barbárie. As desigualdades hoje é justificada como se fosse resultado de escolhas não boas. Mas quem pode escolher??

A essência do ser humano é fruto das relações sociais. O que queremos fazer de nosso mundo, o mundo humano, vamos continuar nossa aventura humana? Essa é a questão do ser humano. A educação do ser humano. Nascemos hominizados, mas não nascemos humanizados, a educação é que irá nos humanizar. É um direito antropológico fundamental, sem educação não somos ser humanos. Nascer como omnes nos dá o direito de ser humanizados.

A humanização é fundamentalmente relacional. Humanização é um direito para todos os hominizados. O Direito humano é uma questão de escolher o mundo que eu quero viver. O direito se afirma e se exige. É para defender é para lutar, é para exigir.


SIRO DARLAN – Juiz de Segundo Grau do Tribuna de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ); Mestre em Saúde Pública, Justiça e Direitos Humanos; Pós-graduado em Direito da Comunicação Social na Universidade de Coimbra (FDUC), Portugal; Diretor e Editor do Jornal Tribuna da imprensa Livre; Membro da Associação Juízes para a Democracia; Conselheiro Efetivo da Associação Brasileira de Imprensa; Conselheiro Benemérito do Clube de Regatas do Flamengo. Em função das boas práticas profissionais recebeu em 2019 o Prêmio em Defesa da Liberdade de Imprensa, Movimento Sindical e Terceiro Setor, parceria do Jornal Tribuna da Imprensa Livre com a OAB-RJ.